Relatório da FGV aponta que a taxa de juros, mantida a 13,75%, é um dos fatores por trás da desaceleração da economia. Conheça os efeitos nefastos da política do Banco Central para o país
A exorbitante taxa básica de juros (Selic), mantida pelo Banco Central a 13,75% desde agosto do ano passado, é um dos fatores que impedem a retomada da economia brasileira. É o que aponta o Boletim Macro, editado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre).
Na edição de fevereiro, divulgada na quinta-feira (23), o boletim identifica uma desaceleração em vários setores da economia, especialmente na produção e no consumo de bens, e a manutenção da taxa de desemprego na casa dos 8%.
Para o instituto, o cenário atual aponta para um crescimento quase nulo da economia em 2023. “Nossa projeção de crescimento do PIB em 2023 se mantém em 0,2%. (…) Esse cenário resulta de desaceleração que começou no terceiro trimestre de 2022”, afirma o documento.
Como causas dessa desaceleração, o FGV Ibre aponta os efeitos da política monetária restritiva (ou seja, a alta taxa de juros), além dos “impactos cumulativos da desaceleração global, também presente em 2023”.
Juros inaceitáveis
A análise fez com que a presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, voltasse a lembrar da importância de o Brasil ter juros mais baixos. “Com os juros altos desse jeito, é com esse cenário que vamos nos deparar, sem crédito, sem investimento. BC tem de mudar a política monetária pelo bem do Brasil”, escreveu no Twitter.
Boletim da FGV alerta pra desaceleração da economia em vários setores e no mercado de trabalho. Com os juros altos desse jeito é com esse cenário que vamos nos deparar, sem crédito, sem investimento. BC tem de mudar a política monetária pelo bem do Brasil.
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) February 23, 2023
O que Gleisi afirma é o que dizem também diversos economistas renomados. Lembremos o que afirmou, em artigo recente, um grupo de especialistas, entre os quais Luis Carlos Bresser-Pereira, Monica de Bolle, Luis Gonzaga de Mello Belluzzo e Paulo Nogueira Batista Jr.:
“A taxa de juros no Brasil tem sido mantida exageradamente elevada pelo Banco Central e está hoje em níveis inaceitáveis. O discurso oficial em sua defesa não encontra nenhuma justificativa, seja no cenário internacional ou na teoria econômica.”
O que os juros altos fazem?
1. Travam o investimento
Não faz sentido o Brasil manter a taxa de juros a 13,75%, porque ela simplesmente impede investimentos. Afinal, que empresário vai assumir o risco de pegar dinheiro emprestado em um banco tendo de pagar juros tão altos pelo empréstimo?
Sem investimentos, a produção cai, o desemprego sobe, a economia para. O fato é que a atual taxa de juros está empurrando o Brasil para um grave risco de entrar em recessão econômica.
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2. Tornam o rentismo mais vantajoso
Além disso, passa a ser mais vantajoso para o empresário pegar o dinheiro que tem e virar rentista. Por quê? Porque com uma inflação anual a 5,77% e a Selic a 13,75%, o Brasil se torna o país com a taxa real de juros (Selic menos inflação) mais alta do mundo, em torno de 8%.
Como escreveu André Lara Resende, um dos pais do Plano Real, em artigo no fim do ano passado: “No mundo hoje, só o Brasil garante aos rentistas uma taxa real perto de 8% ao ano sem risco e com liquidez imediata. Sem risco, sim, pois a dívida pública de um país com moeda fiduciária e um Estado institucionalizado não tem risco de crédito.”
3. Fazem o país gastar mais com juros da dívida do que com o povo
Por falar em dívida pública, quanto mais a taxa de juros sobe, mais o orçamento brasileiro é desviado para pagar juros e amortizações da dívida. Isso acontece porque cerca de 40% da dívida pública é indexada à taxa Selic.
Segundo artigo da economista Mônica de Bolle, da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, ao subir a taxa de juros de 2%, no início de 2021, para 13,75%, em agosto de 2022, o Banco Central fez com que a despesa do governo com a dívida pública saltasse de 2% do PIB para 10% do PIB, ou de R$ 135 bilhões para R$ 920 bilhões por ano.
Para se ter uma ideia, a redução de apenas 0,5% da taxa de juros faria o governo ter à disposição mais R$ 17 bilhões, o que equivale a um ano de Minha Casa Minha Vida e Farmácia Popular.
Hoje, mais de 46% de todo o orçamento brasileiro vai para pagar juros da dívida pública, como mostra o gráfico abaixo, elaborado pela Auditoria Cidadã da Dívida. E quem recebe esse dinheiro? Segundo o próprio Banco Central, 53,6% são instituições financeiras e fundos de investimentos.
4. No cenário atual, não combatem a inflação
A taxa de juros é usada no mundo todo para combater a inflação. Mas esse mecanismo só funciona quando a inflação é causada por demanda, ou seja, porque a população está comprando mais do que é produzido.
Esse, claramente não é o caso do Brasil hoje. Como afirmam os economistas no artigo citado acima:
“Nenhum dos países dotados de recursos e economias estruturadas possui uma taxa de juros sequer próxima da que prevalece no Brasil. E todos esses países reconheceram o caráter excepcionalíssimo do surto inflacionário recente, explicado pela pandemia e pelo conflito bélico, não por excesso de demanda”.
Além disso, controlar a inflação não é o único objetivo do Banco Central, segundo a lei que lhe conferiu autonomia. Como lembrou André Lara Resende, em entrevista ao programa Canal Livre, da Band, no último dia 12, o BC também deve promover a estabilidade do sistema financeiro e garantir o mais próximo possível do pleno emprego. “Obviamente que essa taxa de juros de 13,75%, 8% real, é incompatível com esses objetivos. Ela está errada” (assista abaixo).
5. Afetam os seus gastos no dia a dia
A taxa de juros estabelecida pelo Banco Central serve de guia para todas as outras taxas no Brasil. Assim, se ela sobe, toda a população fica prejudicada.Veja o que disse o economista Eduardo Moreira:
“É uma coisa que nos prejudica no nosso dia a dia, porque o crédito que a gente toma é mais caro, o cartão de crédito é mais caro e o crédito direto ao consumidor também é mais caro. A economia anda mais devagar, as pessoas têm menos emprego”.
Da Redação da Agência PT