Um grupo de 17 juristas, advogados, ex-ministros da Justiça e ex-membros de Cortes Superiores de oito países escreveu um texto conjunto em que pede ao STF (Supremo Tribunal Federal) a libertação de Lula e a anulação de processos a que ele responde na Justiça.
Eles afirmam que as revelações do escândalo das mensagens trocadas entre o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Operação Lava Jato, e Sérgio Moro, que condenou Lula, “estarreceram todos os profissionais do direito”.
“Ficamos chocados ao ver como as regras fundamentais do devido processo legal brasileiro foram violadas sem qualquer pudor”, afirmam ainda no texto. “Num país onde a Justiça é a mesma para todos, um juiz não pode ser simultaneamente juiz e parte num processo.”
Práticas imorais da Lava Jato
Eles seguem: “Por causa dessas práticas ilegais e imorais, a Justiça brasileira vive atualmente uma grave crise de credibilidade dentro da comunidade jurídica internacional”.
Os juristas que assinam o manifesto são de países como França, Espanha, Itália, Portugal, Bélgica, México, EUA e Colômbia.
Entre os signatários está Susan Rose-Ackerman, professora de jurisprudência da Universidade de Yale, nos EUA. Ela é considerada uma das maiores especialistas do mundo em combate à corrupção.
O procurador Deltan Dallagnol já recomendou entrevistas dela, apresentando a professora em redes sociais como “maior especialista mundial em corrupção e seu controle”.
O marido dela, Bruce Ackerman, também assina o documento. Ele foi professor do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, em Yale. Os dois são amigos há 30 anos.
Corrupção e Justiça
O magistrado brasileiro chegou a convidar Bruce Ackerman para participar de um seminário no Brasil sobre democracia, corrupção e justiça.
Outros nomes de peso que assinam a carta são o professor italiano Luigi Ferrajoli, referência do garantismo jurídico no mundo, o ex-juiz espanhol Baltasar Garzón, que condenou o ex-ditador chileno Augusto Pinochet por crimes contra a humanidade, Alberto Costa, ex-ministro da Justiça de Portugal, e Herta Daubler-Gmelin, ex-ministra da Justiça da Alemanha.
O grupo é integrado ainda por ex-presidentes e integrantes de cortes superiores, como Pablo Cáceres, ex-presidente da Suprema Corte de Justiça da Colômbia, e Diego Valadés, ex-juiz da Suprema Corte de Justiça do México e ex-procurador-geral da República.
Moro, ”juiz” parcial
Moro é o alvo central das críticas. Segundo os juristas, ele “não só conduziu o processo de forma parcial, como comandou a acusação desde o início”. “Manipulou os mecanismos da delação premiada, orientou o trabalho do Ministério Público, exigiu a substituição de uma procuradora com a qual não estava satisfeito e dirigiu a estratégia de comunicação da acusação.”
“Hoje, está claro que Lula não teve direito a um julgamento imparcial”, afirmam. “Não foi julgado, foi vítima de uma perseguição política.”
Segundo eles, a luta contra a corrupção é essencial. Mas “no caso de Lula, não só a Justiça foi instrumentalizada para fins políticos como o Estado de Direito foi claramente desrespeitado, a fim de eliminar o ex-presidente da disputa política”.
Eles finalizam dizendo ser “indispensável” que os juízes do STF “exerçam na plenitude as suas funções e sejam os garantidores do respeito à Constituição”. E pedem que as autoridades “tomem todas as providências necessárias para identificar os responsáveis por estes gravíssimos desvios de procedimento”.
VEJA ABAIXO O ARTIGO NA ÍNTEGRA E TODOS OS SIGNATÁRIOS
Lula não foi julgado, foi vítima de uma perseguição política
Nós, advogados, juristas, ex-ministros da Justiça e ex-membros de Cortes Superiores de Justiça de vários países, queremos chamar à reflexão os juízes do Supremo Tribunal Federal e, mais amplamente, a opinião pública do Brasil para os graves vícios dos processos movidos contra Lula.
As recentes revelações do jornalista Glenn Greenwald e da equipe do site de notícias The Intercept, em parceria com os jornais Folha de São Paulo e El País, a revista Veja e outros veículos, estarreceram todos os profissionais do Direito. Ficamos chocados ao ver como as regras fundamentais do devido processo legal brasileiro foram violadas sem qualquer pudor. Num país onde a Justiça é a mesma para todos, um juiz não pode ser simultaneamente juiz e parte num processo.
Sérgio Moro não só conduziu o processo de forma parcial, como comandou a acusação desde o início. Manipulou os mecanismos da delação premiada, orientou o trabalho do Ministério Público, exigiu a substituição de uma procuradora com a qual não estava satisfeito e dirigiu a estratégia de comunicação da acusação.
Além disso, colocou sob escuta telefônica os advogados de Lula e decidiu não cumprir a decisão de um desembargador que ordenou a liberação de Lula, violando assim a lei de forma grosseira.
Hoje, está claro que Lula não teve direito a um julgamento imparcial. Ressalte-se que, segundo o próprio Sérgio Moro, ele foi condenado por “fatos indeterminados”. Um empresário cujo depoimento deu origem a uma das condenações do ex-presidente chegou a admitir que foi forçado a construir uma narrativa que incriminasse Lula, sob pressão dos procuradores. Na verdade, Lula não foi julgado, foi e está sendo vítima de uma perseguição política.
Por causa dessas práticas ilegais e imorais, a Justiça brasileira vive atualmente uma grave crise de credibilidade dentro da comunidade jurídica internacional.
É indispensável que os juízes do Supremo Tribunal Federal exerçam na plenitude as suas funções e sejam os garantidores do respeito à Constituição. Ao mesmo tempo, esperamos que as autoridades brasileiras tomem todas as providências necessárias para identificar os responsáveis por estes gravíssimos desvios de procedimento.
A luta contra a corrupção é hoje um assunto essencial para todos os cidadãos do mundo, assim como a defesa da democracia. No entanto, no caso de Lula, não só a Justiça foi instrumentalizada para fins políticos como o Estado de Direito foi claramente desrespeitado, a fim de eliminar o ex-presidente da disputa política.
Não há Estado de Direito sem respeito ao devido processo legal. E não há respeito ao devido processo legal quando um juiz não é imparcial, mas atua como chefe da acusação. Para que o Judiciário brasileiro restaure sua credibilidade, o Supremo Tribunal Federal tem o dever de libertar Lula e anular essas condenações.
Lista de Signatários
Bruce Ackerman, professor Sterling de direito e ciência política, Universidade Yale
John Ackerman, professor de direito e ciência política, Universidade Nacional Autônoma do México
Susan Rose-Ackerman, professora emérita Henry R. Luce de jurisprudência, Escola de direito da Universidade Yale
Alfredo Beltrán, ex-presidente da Corte Constitucional da Colômbia
William Bourdon, advogado inscrito na ordem de Paris
Pablo Cáceres, ex-presidente da Suprema Corte de Justiça da Colômbia
Alberto Costa, Advogado, ex-ministro da Justiça de Portugal
Herta Daubler-Gmelin, advogada, ex-ministra da Justiça da Alemanha
Luigi Ferrajoli, professor emérito de direito, Universidade Roma Três
Baltasar Garzón, advogado inscrito na ordem de Madri
António Marinho e Pinto, advogado, antigo bastonário (presidente) da ordem dos advogados portugueses
Christophe Marchand, advogado inscrito na ordem de Bruxelas
Jean-Pierre Mignard, advogado inscrito na ordem de Paris
Eduardo Montealegre, ex-presidente da Corte Constitucional da Colômbia
Philippe Texier, ex-juiz, Conselheiro honorário da Corte de Cassassão da França, ex-presidente do Conselho econômico e social das Nações Unidas
Diego Valadés, ex-juiz da Corte Suprema de Justiça do México, ex-procurador-Geral da República
Gustavo Zafra, ex-juiz ad hoc da Corte Interamericana de Direitos Humanos
Originalmente postado na Folha de S.Paulo