Primeiro avião da FAB deve trazer ao Brasil 230 pessoas até o fim desta semana; expansão da guerra no Oriente Médio preocupa governo federal por conta da enorme comunidade de brasileiros na região
Depois de autorizada pelo presidente Lula a retirada de cidadãos brasileiros do Líbano, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) se movimenta para executar a operação de resgate. Israel deu início, na noite desta segunda-feira (30), a uma incursão militar terrestre no país árabe ao norte de suas fronteiras para confrontar o grupo armado Hezbollah. Condenada inclusive pelo Papa Francisco, a expansão da guerra no Oriente Médio preocupa o governo federal pela quantidade de brasileiros na região.
Em entrevista à TV Globo, o chanceler, Mauro Vieira, antecipou que o primeiro avião da Força Aérea Brasileira (FAB) deve decolar com 230 pessoas até o fim desta semana e que o governo federal fará quantos voos forem necessários até que todos os brasileiros estejam fora de perigo. Informações da CNN Brasil apontam para uma megaoperação: de acordo com estimativas não oficiais, seriam 20 voos da FAB para salvar 3 mil vidas.
“Já estão mapeados todos. A colônia brasileira tem contato permanente com a embaixada. E já estamos com uma lista que estamos preparando e faremos, em breve, um primeiro voo para repatriar. Essa operação está sendo realizada, em conjunto, pelo Ministério das Relações Exteriores e o Ministério da Defesa, com a participação, obviamente, da Força Aérea Brasileira”, esclareceu Vieira.
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A invasão por terra ao Líbano constitui nova etapa da sangrenta guerra levada a cabo pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, contra o Hezbollah. Nas duas semanas anteriores, as Forças de Defesa de Israel (IDF, sigla em inglês) prepararam o terreno para a incursão militar ao explodirem pagers e walkie-talkies pertencentes a militantes do grupo armado e ao eliminarem, em Beirute, o secretário-geral do Hezbollah, Sayyid Hassan Nasrallah, que era admirado por muçulmanos xiitas em todo o Oriente Médio.
O lado da paz
O Papa Francisco condenou a ofensiva israelense contra o Líbano e tachou as condutas de Netanyahu de “imorais”. “O uso desproporcional de força é imoral”, censurou o pontífice, falando a jornalistas. No mesmo tom, durante encontro empresarial no México, o presidente Lula afirmou que o primeiro-ministro de Israel está “atacando e matando pessoas inocentes” no Líbano e chamou de “chacina” o que ocorre na Faixa de Gaza.
“A guerra é a prova da incapacidade civilizatória de um cidadão que acha que pode, na explicação de ter que se vingar de um ataque, fazer matança desnecessária com pessoas que não têm como se defender”, lamentou Lula, em discurso a empresários, na Cidade do México.
Por meio das redes sociais, a presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), alertou para a índole violenta e sectária da extrema direita. “Papa Francisco condena o novo massacre de civis inocentes, agora no Líbano, perpetrado pelo governo de Netanyahu, chamando a atenção para a violência dos ataques. Para seguir no poder em Israel, a extrema direita ameaça o mundo com uma guerra total”, denunciou Gleisi.
Papa Francisco condena o novo massacre de civis inocentes, agora no Líbano, perpetrado pelo governo de Netanyahu, chamando a atenção para a violência dos ataques. Para seguir no poder em Israel, a extrema direita ameaça o mundo com uma guerra total.
— Gleisi Hoffmann (@gleisi.bsky.social) September 30, 2024 at 11:36 AM
Resgate complexo
Ao jornal O Globo, nesta terça (1), o assessor especial de Lula para assuntos internacionais, Celso Amorim (PT), disse que a guerra de Israel não é contra o Hezbollah, mas contra todo o Líbano, e reconheceu a necessidade de repatriar cidadãos dadas as dimensões da comunidade brasileira.
“Não há dúvida de que precisamos retirar os brasileiros que queiram sair. A guerra não é contra o Hezbollah, é contra o Líbano todo, então, obviamente, os brasileiros estão sendo atingidos”, definiu.
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Amorim liderou operação semelhante, quando era ministro das Relações Exteriores, durante a Guerra do Líbano de 2006, o último conflito entre Israel e o Hezbollah. O ex-chanceler ressaltou a complexidade do resgate, à época. O governo federal contou com o suporte de empresas aéreas para repatriar 3 mil pessoas.
“Muitos brasileiros estão vivendo no Vale do Bekaa. Pela minha experiência da outra guerra, a região é muito atingida”, esclareceu, referindo-se a porções do leste do Líbano.
Guerra total
Em recente entrevista ao podcast The Spectator, John Mearsheimer, professor de ciência política e teórico das Relações Internacionais ligado à Universidade de Chicago, previu um conflito de longa duração entre árabes, israelenses e persas. Mearsheimer descartou a eliminação do chamado “Eixo da Resistência”, a aliança de muçulmanos xiitas liderada pelo regime do Irã contra o sionismo.
“É concebível que Israel consiga derrotar o Hezbollah no sul do Líbano e empurrá-lo para o norte? Eu acho que é concebível. Mas é provável? Eu acho que a resposta é não. Acho que eles estão entrando no ninho das vespas”, rechaçou o especialista, antes de argumentar que nenhum dos objetivos estabelecidos por Israel, desde o início da guerra contra o Hamas, foi concluído.
“Eles [os israelenses] já tentaram isso e não funcionou muito bem, em 1982. E não há razões para acreditar que vá funcionar agora”, explicou Mearsheimer, ao lembrar da Guerra do Líbano de 1982.
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PT Nacional, com informações do MRE, O Globo, CNN Brasil, The Spectator