Fake news prejudicam as pessoas e a democracia, avaliam especialistas e parlamentares

O fenômeno conhecido como fake news (notícias falsas) foi tema de debate organizado pela Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, nesta quinta-feira (23). A autora do requerimento que provocou a discussão, deputada Maria do Rosário (PT-RS), alertou para o malefício que a disseminação de mentiras e boatos podem causar às vítimas, como ocorreu principalmente nas eleições presidenciais de 2018 – em que a difusão de notícias mentirosas pela rede mundial de computadores, a internet, foi o marco das disputas eleitorais.

“Esse fenômeno é extremamente prejudicial para quem é vítima das informações falsas e tem sua reputação depreciada e muitas vezes sua vida mudada em função das mentiras”, alertou a petista em seu requerimento.

Para ela, aqueles que recebem a notícia falsa também são afetados, e com isso, pondera Maria do Rosário, as pessoas “se desinformam enquanto pensam estar se informando, e tornam-se multiplicadores da mentira ao repassar essas informações”. “Isso sem falar na vida democrática do País, que sofre interferência e muitas vezes mudanças de rumos devido a mentiras disseminadas nas redes”, acrescentou.

Durante sua exposição, a ex-deputada federal pelo PCdoB Manuela D’Ávila alertou para os impactos da disseminação de notícias falsas nas sociedades em todo o mundo, como também na vida das pessoas. Além de interferir no debate político, chegando a definir os resultados de eleições, as notícias falsas também têm o potencial de acabar com a reputação de uma pessoa vítima de uma campanha articulada de desinformação. O desafio, segundo ela, é garantir a responsabilização dos indivíduos sem comprometer o princípio da liberdade de expressão.

“Que a gente tenha claro que o tema das fake news não é algo periférico. Elas estruturam as opiniões sobre todos os temas na sociedade”, avalia Manuela. Para dimensionar o problema, ela citou que, durante as eleições, 70 postagens que a envolviam foram compartilhadas por 300 mil pessoas, alcançando 13 milhões de brasileiros, em apenas dois dias. Ainda assim, Manuela destacou que qualquer iniciativa de combate à desinformação não pode representar um retrocesso em relação ao Marco Civil da Internet, que se baseia nos princípios de liberdade e neutralidade da rede.

Liberdade de expressão

Durante o debate, Maria do Rosário se contrapôs ao argumento de Eduardo Augusto Maneta, Chefe do Serviço de Repressão aos Crimes Eleitorais da Polícia Federal, que disse que a polícia deve ser acionada em casos “graves”, “extremos”, pois ela atuaria se valendo do Direito Penal. Segundo ele, ao agir fora desses preceitos, se incorreria “na violação do direito de liberdade de expressão prevista na Constituição”.

“Aqui o senhor não encontrará ninguém favorável à censura ou à diminuição do direito de expressão”, observou a deputada que fez questão de esclarecer ao palestrante que o fenômeno fake news não pode ser encarado apenas como uma “dimensão cultural espontânea”.

“É crime. E eu não vi na sua abordagem nenhuma alusão ao combate que a Polícia Federal deve fazer aos grupos criminosos que são pagos a peso de ouro, que vimos ser enfrentados em outros países e, que, no Brasil, estão atuando praticamente de forma liberada”, alfinetou Maria do Rosário.

Punição

O deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) recorreu aos seus conhecimentos sobre a Grécia Antiga para ponderar sobre a questão. “Platão defendia que a lei mais importante de uma nação é combater ruídos, que na época era boato, depois fake news: as mentiras. Porque isso destrói o projeto estratégico de uma nação, destrói a vida das pessoas”, alertou.

Para fazer o enfrentamento dessa questão, o deputado defendeu a necessidade de se promover “A Semana de Conscientização da Cidadania Virtual”. Ao mesmo tempo, o parlamentar acredita que é preciso penalizar os agressores virtuais.

“Temos que multar quem compartilha cards, postagens apócrifas e quem as produzir temos que criminalizar. Não vai ter outro caminho a curto prazo”, defendeu Reginaldo Lopes.

A presidenta da Comissão de Cultura, deputada Benedita da Silva (PT-RJ), lembrou que foi na política que as fake news afloraram. “O que temos como legado dessas eleições? As fake news. Elas roubaram os sonhos de pessoas. Tiraram a fé de muitos, de pessoas simples que acreditaram nessas coisas terríveis que foram passadas. Foi muito cruel, foi crime cometido que temos que batalhar para que haja punição”, afirmou.

Manuela D’Ávila acredita que as polícias e o Poder judiciário não estão aptos a responder às demandas de combate aos crimes virtuais. “Não temos capacidade instalada para lidar com a demanda, e a impunidade é crucial para a proliferação de mentiras. As pessoas acham que não existe lei porque não há processo investigativo”, observou Manuela.

Boatos

Também participou da audiência o criador e editor do site boatos.org, Edgard Matsuki. Para além da desinformação na esfera política, ele chamou a atenção para dois temas mais graves, porque não contam com a mesma atenção dedicada aos desmentidos: as notícias falsas na saúde, como boatos sobre a ineficácia de vacinas ou tratamento contra doenças graves, como o câncer; e as falsas imputações de crimes a inocentes. Ambas as práticas têm levado à morte de pessoas, o que aponta para a gravidade das fake news.

Ele defendeu iniciativas de “educação para mídias digitais” nas escolas, que ensinassem princípios básicos para a identificação de notícias falsas, e alertou que nem todas as pessoas que compartilham esse tipo de conteúdo duvidoso o fazem com má intenção, como, por exemplo, aquelas que compartilham fotos de crianças doentes que receberiam um real para cada compartilhamento. Sobre cobrar das próprias plataformas, como Facebook e Google, que fizessem a checagem dos conteúdos, Matsuki ressalta o risco de censura no conteúdo, além de considerar ineficaz tais ações. À medida que barrassem determinados conteúdos, as pessoas migrariam para outro ambiente virtual mais livre, recomeçando o ciclo de problemas.

Benildes Rodrigues com site RBA

 

 

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