Categoria aciona a empresa na Comissão de Valores Mobiliários dos EUA. Ato público foi convocado para quarta-feira à tarde, em frente ao prédio do TCU em Brasília.
Às vésperas da sessão do Tribunal de Contas da União (TCU) que poderá aprovar a venda da Eletrobrás, os eletricitários intensificam as ações políticas. Após a estatal reportar, nesta segunda-feira (16), lucro líquido 69% maior no primeiro trimestre (R$ 2,716 bilhões), entidades da categoria registraram queixa contra a empresa na Security Exchange Commission (SEC), a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos.
Na ação, homologada nesta terça (17), Associação dos Empregados da Eletrobrás (AEEL), Associação dos Empregados de Furnas (ASEF) e Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE) alegam que que os acionistas da empresa não foram devidamente informados sobre valores que Furnas, subsidiária da estatal, terá que dispender com a usina de Santo Antônio em um processo de arbitragem envolvendo a hidrelétrica. Como a Eletrobrás negocia ações na Bolsa de Nova York, está sujeita às regras estadunidenses.
“A Eletrobrás foi construída ao longo de décadas, com o suor e a inteligência de gerações de brasileiros. Mas o atual governo faz de tudo para entregá-la a toque de caixa e a preço de banana. O resultado de mais esse crime de lesa-pátria seria a perda da nossa soberania energética. Defender a nossa soberania é defender também a Eletrobrás daqueles que querem o Brasil eternamente submisso”, advertiu Lula em recente pronunciamento.
“Se a operação de Santo Antônio for comprometida, a Eletrobrás poderá ter que arcar com todos as dívidas da companhia, que podem somar cerca de R$ 18 bilhões, ou US$ 3,5 bilhões”, afirmam em nota as associações. As entidades mencionam sua condição de acionistas para declarar não terem sido informadas sobre os riscos, “caracterizando falta de transparência e uma suspeita de fraude nas demonstrações contábeis”.
Os representantes dos eletricitários apontam ainda que eventual sonegação de informações “tem vínculo direto com a pressa da direção da Eletrobrás em privatizar a companhia a qualquer custo”. As organizações prepararam uma jornada de ações para esta quarta-feira (18), quando há a perspectiva de que o ministro revisor do processo, Vital do Rego, após pedir vistas em abril, anuncie novamente voto contra a privatização.
Na manhã de quarta, a partir das 9h, haverá um “tuitaço” com a hastag #18MEletrobrasPública. Às 13h, começa o ato presencial em frente ao prédio do TCU, em Brasília. Para mobilizar a categoria e militantes contra o entreguismo do desgoverno Bolsonaro, os dirigentes estão divulgando um vídeo de chamamento em defesa da Eletrobras Pública.
“Queremos dobrar o número de manifestantes em frente ao TCU em relação ao último ato, no dia 20 de abril, em que reunimos 300 pessoas”, diz Tiago Vergara, do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), ao Portal da Central Única dos Trabalhadores (CUT). “Entendemos que Brasília é longe para a maioria da categoria e, como não há uma paralisação, é muito difícil que venham companheiros de outros estados.”
“A luta é de todas as organizações e setores sérios e honestos do Brasil que defendem a soberania e o patrimônio nacional. Estamos unidos para sensibilizar os ministros do TCU a impedirem o andamento desse processo, reafirmando o caráter ilegal, injusto e imoral da venda da maior companhia de energia do país”, disse ao Brasil de Fato Leonardo Maggi, coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Ações no Judiciário e no Legislativo denunciam fraude na operação
O ato público em frente ao prédio do TCU é o ápice de ativa campanha movida pelos eletricitários em Brasília, que inclui ações junto ao Judiciário e ao Legislativo. Desde o começo do ano, entidades que representam os servidores públicos da Eletrobras já protocolaram na Justiça Federal cerca de 25 ações questionando a privatização.
Parlamentares do PT também acionaram a Justiça arguindo a lisura do processo, além de propor e promover, em uma semana, três audiências públicas para discutir o tema na Câmara dos Deputados. A primeira ocorreu na última quarta-feira (11), na Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e Amazônia.
Nela, o ex-presidente da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) Vicente Andreu Guillo alertou que a privatização representa a “desnacionalização do sistema hidroenergético” e o desmonte da coordenação nacional construída ao longo de décadas. “Para quem atua na economia brasileira, no setor energético e mesmo no setor de recursos hídricos, essa privatização é simplesmente apavorante”, afirmou.
“Hoje, vemos notícias de que famílias escolhem entre comer e pagar a conta de luz. O que nós estamos vendo aqui é um projeto de privatização que não vai ter outro efeito que não aumentar ainda mais a conta de luz para as famílias brasileiras”, confirmou Ikaro Chaves, representante do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE)
Coordenadora do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), Fabíola Antezana reclamou que o tema passou pelo Congresso por meio de medida provisória (MP 1031/21) sem debate público, durante a pandemia. Também chamou a atenção para a substituição de duas peças-chave do desgoverno Bolsonaro em um momento decisivo.
“Ao nosso ver, a saída do presidente de Furnas está diretamente ligada ao escândalo de Santo Antônio (usina hidrelétrica): uma empresa privada que teve aporte do governo federal inclusive para a sua concretude”, acusou a dirigente da classe. “Quanto à exoneração do ministro Bento (Albuquerque, do MMA), não teremos uma diminuição no preço dos combustíveis, porque a nossa política hoje é equivocada, atrelada aos preços internacionais, que é o que se tenta fazer também com Eletrobras”, concluiu Antezana.
Substituto de Bento, o economista Adolfo Sachsida assumiu na última quarta (11) reafirmando a prioridade da privatização para seu ex-chefe Paulo Guedes. “Vender a Eletrobras é uma prioridade para o nosso governo. Temos que insistir na agenda de privatizações e concessões”, afirmou Sachsida, que partiu para o corpo-a-corpo com os ministros do TCU favoráveis à privatização nestas segunda e terça.
Conta pode subir mais de 16%, estima a Aneel
Enquanto Sachsida tentava combinar o jogo com ministros amigáveis, a Comissão de Legislação Participativa da Câmara discutia, nesta segunda-feira (16), o impacto da venda sobre as tarifas. O presidente do colegiado, Pedro Uczai (PT-SC), que propôs o debate, citou levantamento da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) apontando risco de aumento de até 16,1% da conta de luz com a privatização.
“Hoje, vemos notícias de que famílias escolhem entre comer e pagar a conta de luz. O que nós estamos vendo aqui é um projeto de privatização que não vai ter outro efeito que não aumentar ainda mais a conta de luz para as famílias brasileiras”, confirmou Ikaro Chaves, representante do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE).
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Além do aumento na conta de luz, o engenheiro eletricista da Eletronorte e diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobrás (AESEL) apontou para a dilapidação do patrimônio nacional. “Nós estamos falando aqui de uma empresa que valeria hoje no mínimo R$ 400 bilhões para se construir, e o que se quer é entregá-la por R$ 67 bilhões, pouco mais de 10% do valor”, alertou.
Gustavo Teixeira, do Instituto Ilumina, disse que falta vontade, e não capacidade de investimento na estatal. Segundo ele, em vez de beneficiar o setor produtivo e demais consumidores, a desestatização terá como beneficiários atores financeiros, atraídos pela remuneração garantida de serviços regulados. Lembrou ainda que o setor elétrico é um dos que mais distribui dividendos no Brasil, transferindo recursos das famílias e das empresas para investidores institucionais.
Na terça-feira (17), a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara realizou audiência pública sobre os impactos da privatização na manutenção dos postos de trabalho. As condições de prestação do serviço público sob responsabilidade da empresa e a sua política de precificação também foram discutidas.
“Há sérios riscos no processo que devem ser considerados e debatidos por este Parlamento”, disse Rogério Correia (PT-MG), autor do pedido de realização da audiência. O deputado lembrou que há possibilidade palpável de concentração de mercado, de aumento da tarifa de energia, de demissão em massa e perda de direitos trabalhistas, e de precarização dos postos de trabalho, uma vez que é comum nas empresas privatizadas o aumento da terceirização e dos acidentes de trabalho.
Lula: “Defender a nossa soberania é defender também a Eletrobrás”
Na última terça-feira (10), a Comissão de Infraestrutura (CI) do Senado aprovou dois requerimentos para a realização de audiências públicas para tratar da privatização da Eletrobrás sugeridos pelo líder da Minoria na Casa, Jean Paul Prates (PT-RN). O senador quer analisar as consequências do negócio para a Itaipu Binacional e a Eletronuclear.
Alguns dias antes, durante o discurso que fez no lançamento do Movimento “Vamos Juntos pelo Brasil”, em Belo Horizonte, Luiz Inácio Lula da Silva se posicionou não apenas contra a privatização da Eletrobras como também as dos Correios, dos bancos públicos e contra o desmonte da Petrobras.
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“A Eletrobrás foi construída ao longo de décadas, com o suor e a inteligência de gerações de brasileiros. Mas o atual governo faz de tudo para entregá-la a toque de caixa e a preço de banana. O resultado de mais esse crime de lesa-pátria seria a perda da nossa soberania energética”, criticou Lula. “Defender a nossa soberania é defender também a Eletrobrás daqueles que querem o Brasil eternamente submisso.”
Segundo o presidente mais popular da história, programas sociais como o Luz para Todos, que levou energia para 16 milhões de pessoas, serão inviabilizados se a maior empresa de geração de energia da América Latina, responsável por quase 40% da energia consumida no Brasil, for para as mãos da iniciativa privada. Além disso, haverá aumento de tarifas e perda também de parte da soberania sobre alguns dos principais rios do país, como o São Francisco e o Paraná.
Lula voltou a se manifestar de forma veemente contra as privatizações em Juiz de Fora (MG), três dias depois. “Eu quero dizer ao governo brasileiro e aos empresários: parem de tentar privatizar as nossas empresas públicas”, afirmou. “Parem de tentar privatizar a Eletrobrás. Porque, se não fosse a Eletrobrás, não teria o Programa Luz Pra Todos, que custou R$ 20 bilhões e só pôde ser feito porque a empresa era pública”, finalizou.
Da Redação da Agência PT, com informações de Portal CUT e FNU