Divergências entre o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra da Silva Martins Filho e o procurador-geral do Ministério Público do Trabalho (MPT), Ronaldo Curado Fleury sobre o projeto de lei (PL 6787/16), que trata da Reforma Trabalhista, marcaram a primeira audiência pública da comissão nesta quinta-feira (16).
O procurador–geral do Trabalho, Ronaldo Fleury disse que estava ali na audiência representando a visão do MPT. Ele disse que a história mostra que a “modernização” que o governo quer promover na CLT trará precarização dos empregos.
“Trará apenas a possibilidade de troca de empregos hoje protegidos para empregos desprotegidos, porque a proposta não traz nenhuma garantia de criação de empregos. Ela não assegura a criação de empregos. E, propostas muito semelhantes, algumas idênticas, já foram tentadas em vários países como Espanha, México, Portugal e Grécia e os efeitos foram catastróficos”, alertou o procurador que se valeu da experiência desses países que flexibilizaram suas legislações.
Ainda, segundo Ronaldo Fleury, a justificativa usada pelo autor do projeto de lei de que a CLT é uma “velha senhora” de 75 anos e, por isso, deve ser modernizada não se sustenta. “75% dos artigos da CLT já foram modificados o que joga por terra esse argumento. O marco legal do Direito do Trabalho não é mais a CLT é a Constituição Federal”, sustentou.
Sobre o ponto da proposta que estabelece que os acordos coletivos prevaleçam sobre o que determina a legislação trabalhista, o procurador disse que o negociado sobre o legislado já está previsto na Constituição, desde que “o negociado venha para melhorar as condições do trabalho e não para piorar como está previsto no projeto”.
Diferentemente, Ives Gandra Filho, que esclareceu que não estava falando em nome do pleno do TST, elogiou a proposta. “Falo por minha conta e risco”, disse taxativo antes de elencar os pontos que classificou de “fundamentais” para resolver o problema do desemprego no Brasil.
“O projeto traz pontos que são fundamentais como a questão do trabalho temporário que amplia o tempo; a questão do trabalho parcial que também amplia o horário, a questão do representante de empregados na empresa, a questão de prestigiar a negociação coletiva. São quatro pontos que vão contribuir para nós conseguirmos maior número de empregos”, alegou Ives Gandra Filho, reproduzindo os mesmos argumentos utilizados pelos parlamentares da base governista que compõem o colegiado.
Atento à divergência estabelecida na audiência pública, o deputado Wadih Damous (PT-RJ) elogiou o conteúdo exposto pelo procurador-geral do trabalho. “Ele fugiu à retórica. Trouxe dados que mostram claramente que os países que se aventuraram a fazer o que hoje está se propondo aqui, deram com os burros n’água”, lembrou o deputado.
“Todas as modificações que querem implementar aqui têm gerado, na verdade, desemprego, e precarização das relações de trabalho”, afirmou Damous, que ainda questionou: “É emprego intermitente? É isso que querem implantar no Brasil? É o emprego que talvez seja mais indigno que o desemprego. Não basta estar só empregado, o emprego tem que ser decente”, argumentou.
Wadih Damous não perdeu a oportunidade de alfinetar o presidente do TST. “Louvo a honestidade de vossa excelência em dizer que não representa a magistratura do trabalho porque a grande maioria pensa diferentemente de vossa excelência. Vossa excelência não representa o pensamento majoritário da magistratura trabalhista brasileira. Com todo respeito, ministro! Ainda bem!”, ironizou Damous.
Durante o debate, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) perguntou ao representante do TST se a redação da proposta contou com a sua colaboração. “Eu queria saber do sr. Ives Gandra, se ele ajudou a fazer esse projeto, porque ele o defendeu com muita garra”, interrogou a deputada, que ainda classificou o projeto de “desastroso” e que “fere a Constituição brasileira, por tirar direitos dos trabalhadores”.
Já o deputado Patrus Ananias (PT-MG) fez uma comparação entre os discursos hoje utilizados pelos defensores da proposta com aqueles usados pelos escravocratas no período da escravidão como forma de defesa de seus pontos de vista. “A gente sempre ouve aqui que ninguém é contra os direitos trabalhistas. Somos todos a favor dos trabalhadores. A verdade é que esse discurso foi feito no Brasil durante séculos para defender a escravidão. Todos eram contra a escravidão”, lembrou.
O deputado ainda disse que a proposta do governo ilegítimo de Michel Temer é o mesmo que colocar “raposa cuidando do galinheiro”, se reportando às negociações entre pessoas e poderes economicamente diferenciados.
Benildes Rodrigues
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Foto: Lucio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados