O professor e antropólogo José Jorge de Carvalho, um dos autores da proposta de política afirmativa adotada pela Universidade de Brasília (UnB) criticou nesta terça-feira (28) o ex-PFL, atual DEM, por ter entrado com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o mecanismo. Segundo Carvalho, a iniciativa que pede a suspensão do sistema de cotas na UnB não tem sustentação e é, na verdade, uma repetição do Manifesto dos 113 enviado ao presidente do STF, Gilmar Mendes, em 30 de abril do ano passado, e assinado por um “grupo pequeno que tem acesso à mídia”.
No último dia 20 de julho, o DEM protocolou uma ação contra a política de cotas. O partido oposicionista quer que o STF declare a inconstitucionalidade do sistema e, por fim, leve à suspensão da política adotada pela UnB e por outras instituições de ensino superior em todo País. Para o antropólogo da UnB, a ação apresenta “argumentos frágeis” contra a mudança, um processo que em sua opinião á revolucionário na universidade brasileira. A ação no STF é uma tentativa de ganhar no “tapetão”, afirmou.
“As universidades funcionaram durante 70 anos, de 1930 ao ano 2000, totalmente segregadas. Há poucos países no mundo que têm um universo tão racista quanto o nosso”, avalia. “Não que exista lei para que os negros estejam fora, mas eles estão fora [da universidade]. O racismo estrutural e o racismo institucional fazem que eles estejam fora.”
“Eles [o DEM e quem assinou o Manifesto dos 113] estão dizendo que 90 universidades [onde há política afirmativa] vão ter que jogar para fora todos os estudantes que entraram e não deixarão entrar nunca mais nenhum deles?”, indagou. “Eles estão querendo jogar na rua um contingente de mais de 20 mil estudantes?”.
“O universo acadêmico brasileiro está em uma luta de incluir os negros e os indígenas que estiveram excluídos sempre. Como eles não conseguem mais influenciar na decisão sobre o processo de inclusão, no fundo eles não querem negros na universidade, eles entraram com uma ação no Judiciário”, acusa o professor.
Para o antropólogo, a crítica socioeconômica contra as cotas é falha, assim como o argumento de que a análise dos pedidos é subjetiva. “Se nós fizermos um recorte de renda as pessoas podem falsificar o comprovante de renda. Se fizermos um recorte por origem na escola pública as pessoas também podem falsificar”, aponta.
“Toda política pública tem uma margem de erro. A comissão que analisa os cotistas é uma comissão formada por pessoas da sociedade, do movimento negro, por professores e estudantes. Ela é tão idônea como qualquer outra comissão jamais feita no Brasil”, argumentou José Jorge de Carvalho.
“[Se for para] Discutir a idoneidade dessa comissão tem que discutir a idoneidade de todas as comissões. Tem então que parar com o Bolsa Família para que não haja fraude no programa. A comissão existe para que haja responsabilidade na política”, argumenta.
INFORMAÇÕES – O reitor da UnB, José Geraldo de Sousa Junior, envia nesta terça-feira (28) ao presidente do STF documento em resposta a ofício que solicita informações sobre o sistema de cotas para estudantes negros e indígenas, implementado na instituição em junho de 2003.
A assessora de Diversidade e Apoio aos Cotistas da UnB, Deborah Silva Santos, defendeu a política contra o racismo. “A universidade continua refletindo o racismo que existe na sociedade brasileira.” Deborah assinalou que a política de cotas não é um sistema de privilégios. “Os cotistas têm que passar pelo vestibular. Entram os melhores”, afirmou.
Em setembro, a UnB deverá divulgar uma pesquisa com o perfil e o desempenho dos estudantes cotistas. Há atualmente na universidade 2.620 alunos negros cotistas entre os veteranos e mais 654 calouros cotistas.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2007, a taxa de frequência escolar de pretos e pardos entre 20 e 24 anos era de menos de 21% em todo o País. No ensino médio, havia 153 mil estudantes pretos e 1,1 milhão de pardos naquele ano contra 1,3 milhão de estudantes brancos conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). No ensino fundamental, havia 688 mil alunos pretos e 5,4 milhões de pardos contra 5,6 milhões de brancos.
De acordo com o Censo Demográfico de 2000, baseado na autodeclaração do entrevistado, 53,74% da população brasileira são brancos; 38,45%, pardos; 6,21%, pretos; 0,45%, amarelo; 0,43%, indígena; e 0,71% não declarado.
Equipe Informes , com informações da Agência Brasil