Foi instalada no ano passado a comissão especial criada para debater e elaborar propostas que visem o aprimoramento das instituições brasileiras. O relator da comissão, deputado Rogério Carvalho (PT-SE),entende que houve avanços, que desafios foram superados, mas defende o aprofundamento nos temas que dizem respeito ao Sistema de Governo; Estado versus Governo; Estrutura Federativa e Democracia Representativa e Participativa.
“O nosso sistema de governo é uma inovação, mas ele garante a democracia? O governo está conseguindo fazer valer a vontade popular, ou está sufocado pelas instituições de Estado? São questões que precisamos aprofundar e superar”, avaliou em entrevista ao PT na Câmara.
Confira a entrevista:
Por Benildes Rodrigues
PT na Câmara – O objetivo da comissão é aperfeiçoar a democracia. Como atingir esse objetivo?
Rogério Carvalho – A partir de quatro eixos do debate: Sistema de Governo; Estado versus Governo; Estrutura Federativa e Democracia Representativa e Participativa. A primeira questão é quanto a esse sistema de governo, onde o chefe do estado e do Governo é o presidente da República eleito, associado a um Parlamento que decide sobre questões do governo e Estado. Analisar se esta formatação facilita a democracia.
PT Na Câmara – Qual é a avalição que o senhor faz?
Rogério Carvalho – A minha opinião é que esse sistema de governo fortalece a democracia e torna o Parlamento forte, porque ele é chamado a opinar nas questões de governo e de Estado, em questões relacionadas ao funcionamento da sociedade. Acho que esse sistema favorece a consolidação da democracia.
PT Na Câmara – E a polêmica que envolve a edição de Medidas Provisórias?
Rogério Carvalho – Eu particularmente acho que é um instrumento que fortalece o Congresso Nacional, ao contrário do que dizem, ou seja, que as MPs diminuem a força, ou espremem o Congresso. A MP fortalece o Congresso porque o convida a decidir sobre questões de governo. Se a gente entende que somos um sistema presidencialista, com Parlamento forte não tem como o presidente avançar sem ouvi-lo.
PT Na Câmara – A sociedade tem essa compreensão?
Rogério Carvalho – Precisamos consolidar uma opinião contrária à ideia de que a Medida Provisória é danosa ao país, ou que há ingerência do Executivo sobre o Legislativo. Ambos são autônomos, porém, ambos governam o país e nesta dimensão é preciso que haja provocação permanente daquele que tem a tarefa executiva àquele que tem a tarefa de representar os interesses da sociedade e legitimar as demandas apontadas como fundamentais para garantir a governança.
PT Na Câmara – E o debate sobre governo versus Estado?
Rogério Carvalho – Nossa tradição política é autoritária, centralizadora, distante da tradição democrática. O caminho que a gente encontra para poder refletir sobre o que aconteceu a partir de 1988 é como está o Estado Brasileiro? Como está o governo? São perguntas que precisamos responder.
PT Na Câmara – Mas o governo…
Rogério Carvalho – O governo é a materialização da vontade popular num determinado momento histórico. Este governo está conseguindo valer a vontade popular, ou está sufocado pelas instituições de Estado? Os órgãos acessórios e os complementares da democracia estão mais fortes que as instituições basilares, estruturais da democracia do ponto de vista político? São questões que precisamos aprofundar e identificar como solucionar e superar isso. Caso o entendimento seja de que sim, a gente tem que encontrar caminhos para fortalecer os governos sem que o Estado perca a sua função precípua, que é garantir a estabilidade do funcionamento do país.
PT Na Câmara – O senhor acha que as respostas que estão sendo dadas não estão de acordo com o funcionamento do Estado Brasileiro?
Rogério Carvalho – Na verdade, você tem um conjunto de respostas que enfraquecem a democracia e que cada vez mais quer retirar a representação social, a prerrogativa de governar. Aí o país não amadurece enquanto uma experiência democrática.
PT Na Câmara – Qual abordagem a comissão vai adotar sobre a questão federativa?
Rogério Carvalho – Vamos nos debruçar sobre de que maneira essa experiência federativa pode estar a serviço da consolidação dos direitos que dão face à nossa democracia. Essa estrutura federativa que a Constituição aponta: União, Estados e municípios como concorrentes na prestação de vários serviços que asseguram direitos constitucionais. Os modelos para produzir sincronia da ação entre esses entes têm sido suficientes? A nossa capacidade de operar as políticas, a prestação de serviços, da cooperação entre os entes federados, está garantindo a continuidade do serviço? São temas que queremos consolidar.
PT na Câmara – O quarto eixo do debate está centrado na democracia representativa e participativa. Quais são os pontos cruciais desse debate?
Rogério Carvalho – A nossa democracia é conformada pela representação. Para que essa representação se materialize você precisa ter partidos e eleições. Assim, precisamos discutir qual a cara da democracia representativa, que são os partidos como instrumento público de representação da sociedade. A segunda questão é como o modelo e o regramento para escolha do representante está definida na lei e se há furo nisso.
PT Na Câmara – Como o senhor avalia? Há furos?
Rogério Carvalho – Podemos adiantar que sim. Não temos regulamento completo sobre regras eleitorais. Elas são feitas a cada eleição e isso gera instabilidade e judicialização. Ou seja, muitas vezes a decisão eleitoral não é pelo voto, mas pela justiça. Essa é uma questão fundamental.
PT Na Câmara – E o debate sobre participação popular?
Rogerio Carvalho – Temos esse modelo que vivemos hoje da democracia representativa, mas podemos criar mecanismos com o uso intensivo de tecnologia para que a sociedade participe da vida pública dando opinião, questionando, contribuindo com os governos e os tirando da marginalidade. Transformando-os em seus representantes legítimos.
PT Na Câmara – Qual seriam esses mecanismos?
Rogério Carvalho – Seria lançar mão da tecnologia disponível de comunicação para que possamos assegurar à sociedade uma participação em todos os momentos do ato de governar. Definindo diretrizes dos processos e no acesso aos serviços produzidos e distribuídos pelo estado brasileiro.
PT Na Câmara – Como serão feitos esses debates?
Rogério Carvalho – A comissão aprovou um roteiro de trabalho que contempla quatro seminários, entre abril e junho. Além disso, teremos uma semana de comemoração dos 25 anos da Constituição Federal de 1988, entre os dias 7 e 11 de outubro.
PT Na Câmara – Quais atores vão contribuir com a discussão?
Rogério Carvalho – Os debates terão a participação de representantes da sociedade civil organizada, do governo federal, de estados e municípios, e do Poder Judiciário. Pretendemos fazer um debate acadêmico, de reflexão conceitual. Pretendemos também, ao final de toda a discussão e com toda a contribuição, transformar o conteúdo em propostas objetivas que também serão debatidas com setores da sociedade, inclusive com outros poderes.