Como era de se esperar, a decisão do governo Lula de cobrar impostos dos super-ricos acionou a máquina do lobby e da desinformação que está sempre pronta para defender os interesses dos poderosos e impedir que o Brasil se torne um país mais justo. Exemplo é o artigo publicado no fim de semana, na Folha de S. Paulo, pelo dono do grupo Esfera Brasil e presidente do conselho da CNN Brasil, João Camargo.
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Intitulado ‘Ser rico não é pecado’, o texto faz uma defesa do super-rico brasileiro, definido pelo autor como alguém que “deve ser admirado como o protagonista de uma jornada de sucesso”, “um exemplo de realização”, “uma peça fundamental da máquina que produz crescimento econômico”. Em contrapartida, o governo Lula, na visão de Camargo, é composto por gente desinformada sobre as experiências de outros países e com tendência a “rasgos de tirania”.
Camargo cita dois dados para dar força ao seu argumento de que cobrar impostos dos mais ricos é uma medida ineficiente. O primeiro é o de que vários países na Europa que fizeram movimento nesse sentido voltaram atrás nos últimos anos. O outro é de que a taxação faz os ricos fugirem para outros países com seu dinheiro — e aí ele lembra o caso do ator francês Gerard Depardieu, que se mudou para a Bélgica quando a França resolveu endurecer a legislação fiscal.
O que ele não diz é que boa parte das mudanças recentes na legislação de países europeus se deve à predominância de governos influenciados pelo neoliberalismo e não apenas a uma constatação de que a cobrança de impostos foi um erro. Também esconde que o episódio envolvendo Depardieu estava relacionado a cobranças que chegavam a 75% de alíquota, e que, hoje, sabe-se que é preciso dosar a cobrança para evitar esse tipo de efeito (vale aqui ler artigo do economista André Roncaglia sobre o tema).
A argumentação apresentada por João Camargo só é possível porque os brasileiros são, diariamente, bombardeados por um discurso que vende os ricos como trabalhadores esforçados e merecedores de sua riqueza e o governo e o Estado como incompetentes e inimigos da prosperidade. Assim, o leitor desatento logo acredita que a equipe econômica deve mesmo ser desinformada, quando a verdade é justamente o oposto. O que o ministro Fernando Haddad e Lula propõem é justamente acabar com privilégios e tornar o país mais sintonizado com práticas que existem lá fora.
Elite insensível
Como muito bem observou a presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, nas redes sociais, em resposta ao artigo de Camargo, os privilégios dados aos ricos são a origem da nossa desigualdade. “Ser pobre também não é pecado nem tão pouco sinônimo de insucesso, mas sim resultado de diferenças econômicas abissais em nossa sociedade, da falta de oportunidades, decorrente de um modelo concentrador de renda e da insensibilidade da elite rica e ensimesmada”, escreveu Gleisi.
A também deputada federal continuou perguntado o óbvio: por que o pobre, trabalhador, tem de pagar imposto, e super-rico, não? “Além de pagar sobre consumo, o povo começa a pagar imposto sobre a renda a partir de R$ 2.640”, lembra (leia aqui sobre a injusta cobrança de impostos no Brasil).
Como bem recordou Gleisi, as duas medidas tomadas por Lula na semana passada miram os chamados fundos exclusivos e as aplicações em paraísos fiscais, que inexplicavelmente não são taxados como os demais investimentos.
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“Qual é a contribuição para o Brasil dessa turma que tira dinheiro daqui pra colocar em paraísos fiscais? Investem no quê? Já não estão com o dinheiro no Brasil. E esses fundos exclusivos, de um só dono, que tem de ter no mínimo R$ 10 milhões, contribuem no que pra riqueza do país, a não ser do seu próprio dono. Que conversa desajeitada e absurda! Não venham falar do que aconteceu na França, falsificando a história. O debate tem de ser sobre o que acontece no Brasil real, a indecente desigualdade que existe aqui mesmo, debaixo do nariz de nossas elites econômicas, que ainda pensam como se o Brasil fosse uma colônia escravagista”.
Por fim, a presidenta do PT lembrou que outras medidas ainda serão necessárias. “Para promover a agenda civilizatória no Brasil de hoje, tem de incluir a taxação dos fundos exclusivos e offshores (medidas já anunciadas), o fim dessa excrescência dos Juros sobre Capital Próprio e o fim da isenção dos dividendos”, defendeu.
PT Nacional