Com o voto contrário do PT, Câmara aprova texto-base do PL que permite empresas furar a fila da vacinação contra a Covid

No dia que o Brasil registrou 4.211 mortes por Covid-19 nas últimas 24 horas, totalizando nesta terça-feira (6) 337.364 vítimas, o plenário da Câmara aprovou o texto-base do projeto de lei (PL 948/21), que autoriza empresas a comprarem diretamente, e sem o aval da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), vacinas contra a Covid-19, desde que doe a mesma quantidade ao Sistema Único de Saúde (SUS). A Bancada do PT votou contra e denunciou que a proposta vai desorganizar o Plano Nacional de Imunização, privilegiando quem tem dinheiro, sem respeitar os grupos prioritários.

Para concluir a votação do projeto, os parlamentares ainda precisam apreciar alguns destaques apresentados e podem modificar o texto. A previsão é a de que eles sejam analisados na sessão desta quarta-feira (7).

Ao encaminhar o voto contrário do PT, o líder da bancada, deputado Bohn Gass (RS), enfatizou que o projeto não vai ajudar a reduzir a fila de vacinação do Sistema Único de Saúde e nem significa mais vacinas disponíveis para a população brasileira. Ele enfatizou que existe um Plano Nacional de Imunização e que esses critérios precisam ser respeitados. “Com esse projeto estamos criando duas categorias para a imunização: a das pessoas endinheiradas, que vão poder receber a vacina, e a outra, das pessoas que, talvez, por causa dessas compras, vão ficar ainda mais distantes de serem imunizadas”, denunciou.

Dep. Bohn Gass – Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O deputado Alexandre Padilha (PT-SP) argumentou que a proposta vai tirar oportunidades de vacinas para o Sistema Único de Saúde, vai tirar oportunidades de o governo federal e os governos estaduais e municipais poderem adquirir vacinas para o SUS e vai reservar essas vacinas para quem tem dinheiro para comprá-las e para ter acesso a elas. “Isso pode criar a situação absurda de atrasar ainda mais o Programa Nacional de Vacinação do nosso País, e, ao mesmo tempo, vai fazer com que pessoas furem a fila da vacinação”, protestou.

Ele explicou que, pela proposta aprovada, um banqueiro de 50 anos de idade, por exemplo, vai tomar a vacina antes de uma pessoa de 63, 64, 65 anos. “Várias pessoas que começaram a vacinar agora ou que estão esperando o seu momento na fila de vacinação, vão ver, por ato desta Câmara, seu lugar na fila ser ultrapassado por um banqueiro que tenha dinheiro”, criticou.

Dep. Alexandre Padilha – Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Padilha alertou ainda que o Parlamento, ao aprovar esse projeto, está rasgando a lei que nós — a Câmara e o Senado de forma unânime —votamos há menos de 1 mês, vai colocar o Brasil numa lista vergonhosa de permitir, no meio da maior pandemia da nossa história, deste século, “que o poder do dinheiro possa fazer as pessoas furarem a fila e, mais, bagunçar, desorganizar toda a estratégia de vacinação”.

Vergonha

Na avaliação do deputado Jorge Solla (PT-BA), esse projeto é uma vergonha para o Parlamento. Ele citou que já existe um projeto aprovado que permite a compra privada de vacinas, desde que alcançada primeiramente a cobertura da população alvo prioritária. “Mas, a elite econômica deste País não quer ajudar a resolver o problema da pandemia, quer proteger os seus, eles, seus familiares e os trabalhadores daqueles serviços que garantem o seu lucro, por isso esse projeto é uma vergonha”. Ele acrescentou que o Brasil tem o maior sistema público de vacinação do mundo e é o único País do mundo que está permitindo a compra privada aos ricos. “Esse projeto é a vergonha do Parlamento brasileiro e a destruição do SUS”, reforçou.

Jorge Solla disse ainda que o problema da vacina no Brasil não é a falta de recurso, “apesar da maioria desta Casa, atendendo aos pedidos do presidente Bolsonaro, ter cortado 22% do orçamento da saúde”. Segundo o deputado, o problema é que o governo não comprou a vacina, não tomou as medidas necessárias no tempo certo. O problema é que a elite econômica, que ajudou a eleger Bolsonaro e que ajudou a eleger grande parte dos Parlamentares desta Casa, está com medo porque não está tendo acesso à vacina pública. E quer aproveitar o seu poder econômico, quer aproveitar dos seus apoiadores nesta Casa e do seu apoio do governo Bolsonaro, para tirar a vacina que iria para o povo e vacinar a elite e seus familiares e seus apoiadores”, acusou.

Dep. Jorge Solla – Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Autorização da Anvisa

A Bancada do PT apresentou emenda para redução de danos, incluindo no texto a necessidade da autorização da Anvisa para a compra empresarial da vacina. Os deputados Alexandre Padilha e Jorge Solla argumentaram que, mais grave que furar a fila, é permitir que se compre vacina não foi reconhecida pela Anvisa, que poderá não ter a qualidade nem a eficácia assegurada. “São dois critérios: para o SUS se exige o aval da Anvisa, para as empresas não. Estou desconfiado que foi por isso que a Agência de Vigilância não liberou hoje o pedido do Consórcio do Nordeste para comprar a Sputnik – vacina Russa. Desta forma, os empresários vão poder adquirir essa vacina”, observou Jorge Solla. Ele acrescentou que somente desta forma os empresários encontraram vacina para comprar uma vez que falta o imunizante no mercado. O destaque, no entanto, foi rejeitado.

Foi rejeitado também destaque da Bancada do PT para que a compra empresarial fosse autorizada apenas depois da imunização dos grupos prioritários definidos no Plano Nacional de Imunização – idosos, deficiências, doenças crônicas e profissionais da saúde.

Negligência do governo

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) também afirmou que o problema do Brasil é que o País tem poucas vacinas, e há carência no fornecimento de vacinas no mercado global. “O Brasil perdeu a oportunidade de comprar vacinas na hora certa, e agora uma parte da elite brasileira quer resolver o seu problema e abandonar aqueles que mais precisam, que correm maior risco de adoecimento, maior risco, inclusive, de mortes pelas comorbidades, para estes irem atrás na fila. Esse projeto é uma vergonha para o Parlamento nacional”, afirmou.  Ele acrescentou ainda que a proposta vai estabelecer a vacinação “na base do salve-se quem puder”. “Se combate uma pandemia primeiro protegendo os setores mais vulneráveis para evitar mortes e evitar que o vírus se propague”, explicou.

Dep. Henrique Fontana – Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Na avaliação da deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), a Câmara não poderia colaborar com o processo de desigualdade que nós já temos no Brasil, facilitando a alguns tomarem a vacina em detrimento da maioria. “O esforço do Congresso Nacional é pelo povo brasileiro. Nós não podemos entrar aqui nesse processo em que, de novo, os mais pobres ficarão para trás. Eles já estão para trás na renda, já estão para trás no atendimento”, lamentou.

Na avaliação da deputada Gleisi, a Câmara deveria estar discutindo era sobre as vacinas que não foram compradas pelo governo federal, e não autorizando a empresa privada a comprar vacina. “Nós temos escassez de vacina no mercado mundial e nós precisamos garantir que o Brasil compre o maior número de vacinas possível para imunizar a sua população”, afirmou.

Dep. Gleisi Hoffmann – Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

 

Vânia Rodrigues

 

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