Com o voto contrário do PT, base bolsonarista “passa a boiada” e aprova texto-base do novo licenciamento ambiental

Depois de mais de seis horas de obstrução e do voto contrário do PT e dos demais partidos da Oposição, a Câmara aprovou na noite desta quarta-feira (12) o texto-base do projeto de lei do licenciamento ambiental (PL 3729/04), que estabelece regras gerais a serem seguidas por todos os órgãos licenciadores. O texto, aprovado na forma do substitutivo do deputado Neri Geller (PP-MT), libera do licenciamento ambiental obras de saneamento básico, de manutenção em estradas e portos e de distribuição de energia elétrica com tensão até 69 kV. Nesta quinta-feira serão apreciados os destaques apresentados e que poderão modificar o texto principal.

“Este projeto é o maior retrocesso de toda a história do País em legislação ambiental. Essa aqui é a mãe da destruição, é a mãe do desmatamento”, protestou o deputado Nilto Tatto (PT-SP), ao anunciar o voto contrário do PT.

O deputado destacou que o licenciamento é o principal instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente. “Portanto, ele pressupõe o interesse público em primeiro lugar. E aqui eu acho que ficou provado, já na própria apresentação feita pelo relator, que este projeto só foi debatido com as organizações ligadas à Confederação Nacional da Agricultura e à Confederação Nacional da Indústria. Nenhuma instituição importante da academia declarou apoio a fazer esse debate neste momento. Nenhuma instituição ligada aos movimentos sociais, aos movimentos populares, às comunidades que poderão ser atingidas. As instituições ambientalistas, aqueles que defendem o direito difuso ao meio ambiente, conhecem o texto”, denunciou Nilto Tatto.

Ele ainda citou relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgado nesta quarta-feira pela imprensa, que mostra que somente 1% das obras paralisadas são por problemas ambientais. “Há muita inverdade nesse rol que estamos ouvindo aqui. Mas é importante também até desenhar o relatório do deputado Neri Geller. Quando você asfalta uma estrada aberta por latifundiário, grileiro, depois de alguns anos, sem licenciamento ambiental, você vai provocar mais desmatamento. Talvez seja preciso desenhar”, provocou.

Deputado Nilto Tatto. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Tragédia ambiental

Na avaliação do deputado Pedro Uczai (PT-SC) o projeto é uma tragédia ambiental. “A nova lei proposta aqui do licenciamento ambiental não é para fazer o licenciamento ambiental, mas para destruir qualquer possibilidade de licenciamento ambiental”, afirmou o deputado citando os retrocessos. “O ponto central do projeto elimina muitas atividades, empreendimentos e obras de qualquer licenciamento. Treze já é possível se elencar aqui. Eu começo a imaginar, em vários setores, como os da nossa região, que, no passado não muito distante, poluíram todos os nossos rios com dejetos de suínos; e para eles não será mais preciso licenciamento ambiental”, lamentou.

Uczai criticou também o dispositivo do projeto que transfere do governo federal para estados e municípios a decisão de fazer ou não o licenciamento. “Imaginem a pressão nos municípios e nos estados de setores interessados em determinados empreendimentos. É passar para os estados e para os municípios a responsabilidade de concederem ou não o licenciamento. Não é a partir de uma norma nacional que o estado ou o município vai fazer a tarefa. Não. Cabe ao estado e ao município decidir qual deve ser licenciado, e qual não, sem orientação nacional, sem base nacional, sem norma nacional. Isso é gravíssimo”, protestou.

Outra mudança grave segundo Pedro Uczai é o auto licenciamento, a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC). “O empreendedor vai ao computador, se inscreve, e depois faz o auto licenciamento. Por esse método, uma obra que não teve licenciamento ambiental, por exemplo, por crime ambiental, ficará liberada porque será permitido ao empreendedor a autoanistia dos crimes ambientais. Nós estamos vivendo a tragédia ambiental neste País”, lamentou.

Deputado Pedro Uczai. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Insegurança jurídica

O deputado Joseildo Ramos (PT-BA) destacou que este projeto acaba se confrontando com o art. 225 da Constituição Federal, que prevê um estudo prévio de impacto ambiental. “É o cerne da questão ambiental”, frisou, acrescentando que esta matéria é um retrocesso que vai gerar insegurança jurídica, porque tem demonstração clara de inconstitucionalidade. “E o que é pior, nós estamos votando uma matéria sensível no momento em que o Ministério do Meio Ambiente tem como titular da pasta um cidadão que comete crime contra o meio ambiente”, lamentou.

Na avaliação de Joseildo Ramos, esse retrocesso vai custar muito caro. “Empresas sérias do agronegócio estão preocupadas, porque certamente exportam alimentos e vão pagar muito caro com a abertura da porteira para passar a boiada. Mais de 600 normas infralegais, como prometeu o delinquente do Ricardo Salles naquela fatídica reunião do Ministério de Bolsonaro. Ele abriu a porteira e está paralisando o Ibama, que não pode fiscalizar mais nada, e o ICMBio”, denunciou.

Deputado Joseildo Ramos. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) também frisou que essa lei de licenciamento ambiental pode, sim, dificultar, cada vez mais, a presença do Brasil na pauta da exportação. “Pode prejudicar um setor exportador como o agronegócio, porque o mundo não vai admitir, em hipótese alguma, práticas de produção que venham destruir os nossos biomas, que venham poluir as nossas nascentes, as nossas veredas, o nosso verde, que venham destruir as nossas florestas”, alertou.

 Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Desmatamentos e queimadas

Na avaliação do deputado Henrique Fontana (PT-RS), desde que esta linha política do bolsonarismo de relaxamento dos controles ambientais assumiu os rumos do País, o Brasil só anda para trás: perde mercados e é desrespeitado. “O Brasil real é um País que tem cada vez mais desmatamento, cada vez mais queimadas, cada vez mais bacias hidrográficas comprometidas. E aí, qual é a proposta do deputado Kim Kataguiri e do deputado Neri Geller? Vamos liberar ainda mais, porque, para gerar emprego, nós temos que dar mais liberdade para que a poluição avance, para que as queimadas avancem, para que o desmatamento avance”, criticou.

Fontana citou que pelo projeto ficam expressamente dispensados de licença o cultivo de espécies de interesse agrícola, temporárias, semiperenes e perenes; a pecuária extensiva semi-intensiva; e a pecuária intensiva de pequeno porte. “Liberar completamente o licenciamento ambiental de tudo isso? Isso é desenvolvimento? Isso é crescimento? É evidente que não”, protestou.

Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Lei da “boiada”

O deputado Vicentinho (PT-SP) disse que essa lei tem que ser chamada de “lei da boiada”. Na sua avaliação, a aprovação do projeto mostra um Parlamento que “curva a cabeça” diante do Bolsonaro, que é “um destruidor da vida” em todos os tempos. “Esse projeto, portanto, é da destruição. E, por isso, é um projeto que nada tem a ver com o coronavírus. É um projeto que nada tem a ver com a vida. Por isso, nossa posição é radicalmente contrária. É preciso proteger a vida e, inclusive, a economia deste País”, afirmou o deputado, acrescentando que é possível desenvolver o meio ambiente de maneira sustentável.

Dep. Vicentinho (PT-SP) – Foto Agência Câmara

E o deputado João Daniel (PT-SE) considerou que o nome pode até ser bonito: licenciamento ambiental. “Mas, na verdade, querem acabar com a licença ambiental”. Ele argumentou que é preciso preservar o meio ambiente. “Precisamos ter uma legislação firme para defender a questão ambiental. Nós não somos a favor de burocracia, de papelada, nós somos a favor de ter, sim, uma legislação que proteja o meio ambiente. E este projeto é para acabar com a legislação, para liberar as grandes empresas, as mineradoras, aqueles que fazem grilagem de terra, o grande agronegócio. Esta é uma lei que não beneficia a questão ambiental. Deixo o nosso protesto e a nossa luta em defesa do meio ambiente”.

Deputado João Daniel. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

 

Vânia Rodrigues

 

Está gostando do conteúdo? Compartilhe!

Postagens recentes

CADASTRE-SE PARA RECEBER MAIS INFORMAÇÕES DO PT NA CÂMARA

Veja Também