Presidente da República mantém ataques ao próprio ministro da Saúde, ignora recomendações de especialistas para manutenção do isolamento social e ameaça com demissões. PT cobra responsabilidade e diz que governo precisa responder aos desafios da crise sanitária.
O presidente Jair Bolsonaro tem atuado como um sabotador da guerra do país contra o coronavírus. Desde o início da crise sanitária, que mergulhou o mundo num esforço para conter a pandemia, Bolsonaro não só passou a ignorar as recomendações de sanitaristas – inclusive do próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta – como contrariou as orientações de especialistas. “Bolsonaro hoje sabota todo o esforço do país para reduzir o impacto da crise”, critica a presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann.
Neste final de semana, depois de se propor a um jejum e orações em benefício do Brasil, o presidente voltou a ameaçar Mandetta. Sem se referir ao ministro, disse que poderia vir a usar a caneta contra ministros que acham que são estrelas. Ou seja, pode vir a demiti-lo em meio à mais grave crise de saúde pública dos últimos 80 anos no Brasil. Os crimes de Bolsonaro contra a saúde pública e econômica dos brasileiros tem um marco que, certamente, será lembrado quando a “conta chegar”, como já comentam articulistas brasileiros.
Mas a situação pode piorar. Justamente quando o Brasil luta, como outros países, em busca de equipamentos médicos e produtos farmacêuticos, numa corrida junto a fornecedores chineses, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, abre fogo contra o país asiático. Neste final de semana, ele insinuou que a China vai sair “fortalecida” da crise atual causada pelo novo coronavírus, apoiado por seus “aliados no Brasil”, associando a origem do Covid-19 ao país asiático.
A reação chinesa veio nesta mesma segunda-feira, dia 6 de abril: “Tais declarações são completamente absurdas e desprezíveis, que têm cunho fortemente racista e objetivos indizíveis”, aponta manifestação do porta-voz chinês. Coincidentemente, a China também anunciou que vai comprar soja dos EUA por “segurança”. O noticiário chinês vê o Brasil concentrando a contaminação na América Latina e sob risco de enfrentar mais duas epidemias ao mesmo tempo: dengue e gripe.
Consenso na mídia
A denúncia de sabotagem não é apenas figura de linguagem. Esta é a definição dada por duas publicações conservadoras – uma brasileira e outra internacional. A síntese simbólica e definitiva do descalabro que se abateu sobre o Brasil veio em matéria da revista inglesa The Economist, publicada no final de semana. E também pelo jornal O Estado de S.Paulo.
A tradicional revista semanal britânica tratou da atuação do presidente brasileiro, acusando-o de estar “sabotando ativamente os esforços para controlar o vírus” no país. O Estadão usou a mesma expressão – “sabotagem” – no editorial publicado no sábado. “Bolsonaro decidiu desmoralizar publicamente seu ministro da Saúde porque sua única preocupação é consigo mesmo e com a manutenção de seu poder”, opina o diário.
A constatação sobre o papel de Bolsonaro diante da crise coincide com o momento em que o presidente decidiu radicalizar nas ações negacionistas perante a crise. Na semana passada, em entrevista à rádio Jovem Pan, ele voltou a ameaçar Mandetta. “Já sabe que a gente tá se bicando há algum tempo”, respondeu Bolsonaro ao ser questionado sobre o relacionamento com o ministro. “O Mandetta quer fazer valer muito a verdade dele, está faltando humildade para conduzir o Brasil nesse momento delicado”, continuou.
Agindo como o capitão que ameaçava explodir quartéis nos anos 80, Bolsonaro reafirma seu descompasso com os valores militares. Sem meia palavras, disse que “não pretende demiti-lo no meio da guerra”, mas admitiu que Mandetta “extrapolou” em suas funções. Atacar publicamente e ameaçar afastar o “general” das tropas durante a batalha é “crime de guerra”, atestam especialistas em assuntos militares.
Negacionismo
A revista The Economist, que já havia chamado o presidente do Brasil de “Bolsonero”, reafirma observações anteriores de outros veículos. “O movimento negacionista do coronavírus agora tem um líder” estampou em manchete a revista norte-americana The Atlantic. A revista alemã Der Spiegel já havia definido Bolsonaro como “o último negacionista”. Um “vilão internacional”, resumiu o Estadão.
O papel “de quem mais atrapalha do que ajuda”, no entanto, não é prática presidencial apenas dos últimos dias. Antes, Bolsonaro chamou o coronavírus de “gripezinha”, defendeu o retorno das crianças às aulas e realizou “tour” pelas ruas do Distrito Federal. A todo momento, desafia as orientações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para defender suas posições, apela a todo momento para “ fake news”, divulgando-as em seu próprio perfil e nas redes oficiais do governo. Chegou a tentar impulsionar uma campanha pela “volta aos trabalho”, nos moldes da trágica campanha de Milão, sabiamente brecada pelo Judiciário. Na última semana, veiculou vídeo fake para aterrorizar a população sobre inexistente desabastecimento em Belo Horizonte.
PT