Uma questão angustia há tempos o nosso querido Brasil. É a permanência da desigualdade, das injustiças, dos bolsões de pobreza e da violência, apesar das enormes potencialidades do país e dos avanços já obtidos, graças a políticas públicas corajosas implementadas nos últimos anos.
Pois eu entendo que grande parte do caminho a ser trilhado até esse país justo, sustentável e inclusivo, passa pelo respeito aos direitos das mulheres, pela participação efetiva da população feminina nos campos político, econômico, cultural e social.
As últimas eleições gerais e o quadro recente do país demonstram como o sistema político brasileiro, tão criticado pela população, é um sistema predominantemente machista. Com a mudança desse sistema, que temos buscado com conscientização, cursos de formação e debates, com maior abertura para a participação das mulheres e também dos jovens, negros e indíos, teremos de fato um sistema representativo, capaz de levar às mudanças que o país exige.
Apesar da reeleição de uma mulher para a Presidência da República, o último pleito eleitoral ratificou a discriminação contra a população feminina. Para a Câmara Federal foram eleitas 51 deputadas, algo em torno de 10% do total de 513, e cinco senadoras, entre 27 no total. Do mesmo modo, foram eleitas somente 120 deputadas estaduais e distritais, contra a atual bancada de 141 cadeiras femininas nas assembleias legislativas, uma queda de quase 15%.
Deste modo prossegue a sub-representação feminina no Congresso, confirmando as projeções de um estudo divulgado dias antes do pleito pelo Instituto de Estudos Sócio-Econômicos (Inesc), uma importante organização não-governamental, que acompanha as atividades dos Poderes Executivo e Legislativo, em Brasília.
O estudo havia mostrado que eram 25.919 candidatos, dos quais 17.911 homens (69,10%) e somente 8.008 mulheres (30,90%), dado que já mostrava a sub-representação feminina, apesar do crescente número de candidaturas de mulheres. Em 2010, foram 22,4% de candidatas mulheres e 77,6%, de candidatos homens.
Essencial, então, para a reforma do sistema político brasileiro, que as mulheres efetivamente participem como candidatas e que sejam principalmente eleitas. Não é à toa que os países com maior participação feminina nos parlamentos são aqueles considerados mais desenvolvidos, como Suécia, Dinamarca e Noruega.
Mas também é urgente uma revolução na área econômica, com a maior participação da mulher em cargos diretivos e também em termos de rendimentos. Ainda é muito grande a diferença salarial entre homens e mulheres exercendo as mesmas funções. Isto é muito grave, considerando que boa parte das famílias brasileiras é hoje chefiada por mulheres.
Da mesma forma, a participação feminina em cargos de direção e gerenciais é muito restrita. Segundo a Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio (PNAD 2012), a proporção é de 5% nas áreas diretivas e 6,4% nos postos de gerência. A mulher, que tem dupla ou tripla jornada de trabalho, sabe que é tão ou mais capaz de gerenciar negócios do que muitos homens. Mas, infelizmente, a julgar pelos registros oficiais, a violência que afeta e degrada a condição da mulher, continua em alta. Daí a importância da Lei Maria da Penha, que completa neste 7 de agosto, nove anos, como um amplo programa e importante capítulo da nossa história, em defesa dos direitos das mulheres.
A Lei Maria da Penha é a maior conquista na história da busca pela erradicação, prevenção e punição da violência doméstica. É, também, o principal instrumento legal de enfrentamento à violência contra a mulher e uma resposta ao Artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, que impõe ao Estado assegurar assistência à família, na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência, no âmbito de suas relações.
Apesar de a Lei Maria da Penha ser um relevante avanço civilizatório, a violência, que afeta e degrada a situação da mulher brasileira, ainda continua alta. Os números contabilizados pela Central de Atendimento à Mulher, pelo Sistema do telefone 180, criado em 2005, aponta para o registro de 4.124.017 ocorrências.
O levantamento da Central realizou, em 2014, 485.105 atendimentos. Na média, 40.425 atendimentos, ao mês, o que vale dizer, 1.348 atendimentos, a cada dia.
Em comparação com o ano anterior, 2013, a Central de Atendimento à Mulher constatou que, no tocante aos relatos de violência, em 2014 houve aumento de 50% nos registros de cárcere privado, numa média de 2,5 registros, ao dia, e de 18% nos casos de estupro, numa média de três denúncias por dia. O relato de violência sexual contra mulheres – estupros, assédios e exploração sexual – cresceu 20% em 2014, numa média de quatro registros, ao dia.
Muitas vezes é uma violência invisível, as vítimas sofrendo no anonimato. Quantos sonhos, esperanças e potenciais desperdiçados nessa barbárie que continua?
Estamos, portanto, diante de um flagelo, que ultrapassou a questão da violência doméstica. O que temos é algo muito mais grave: Um verdadeiro ataque, uma violação aos direitos humanos das mulheres brasileiras é o que está em curso.
Também continua altíssimo o contingente de mulheres no mercado informal, apesar dos avanços recentes. Em 2011, somente 35,1% das mulheres empregadas tinham carteira assinada, contra 24,2% em 1999. As mulheres negras e pardas continuam sofrendo de dupla discriminação. As mulheres de cor negra e parda representam 52,7% das mulheres ocupadas no trabalho informal, em comparação com 38,2% de mulheres brancas.
Muito mais poderia ser dito. Mas os números citados são suficientes para afirmar que a mulher continua sendo muito discriminada no Brasil, em que pesem muitos saltos dados. Com o respeito aos direitos integrais da mulher, com certeza teremos um país muito mais justo, desenvolvido, pacífico e imune à corrupção. Por isso é que a agenda da mulher é a agenda do Brasil. Vamos à luta, agora!
Ana Perugini é deputada federal, integrante da Comissões de Educação