A reunião dos Bric em Brasília – Paulo Nogueira Batista Jr.

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Os líderes do Brasil, da Rússia, da China e da Índia encontraram-se anteontem em Brasília. Foi a segunda cúpula do grupo. A primeira aconteceu na Rússia no ano passado. A próxima será na China em 2011.

Muitos ainda questionam a relevância dos Bric. À primeira vista, as diferenças culturais, políticas e históricas entre os quatro países dificultariam ou até impediriam uma ação conjunta. “Invenção de banqueiro de investimento”, resmungam os mais céticos.

De fato, a sigla Bric foi inventada por Jim O’Neill, economista-chefe do Goldman Sachs. E daí? Há que se reconhecer, sem preconceitos, que a turma da bufunfa também tem os seus lampejos e suas sacadas geniais. O’Neill cunhou o termo em 2001, muito antes que os quatro países começassem a atuar de forma razoavelmente coordenada.

Apesar das diferenças, Brasil, Rússia, China e Índia têm traços comuns.

O primeiro e mais óbvio: tamanho.

São os quatro gigantes da periferia do sistema internacional – em termos demográficos, de extensão geográfica e da dimensão das suas economias.

Segundo traço comum, ligado ao primeiro: a experiência vem mostrando que os Bric têm capacidade de atuar de forma independente em relação às potências tradicionais (EUA, Europa, Japão). Esse é um aspecto crucial. A maioria dos demais países de mercado emergente ou em desenvolvimento, mesmo os que têm certo porte, não tem essa capacidade, ou pelo menos não na mesma medida. Em muitos casos, o que ainda se vê é uma relação de estreita dependência e alinhamento mais ou menos automático com o chamado Primeiro Mundo.

É claro que a convergência de interesses entre os Bric não é completa.

Há divergências importantes de interesse em várias áreas cruciais.

É difícil prever se esse grupo continuará atuando em conjunto no médio e longo prazos.

Em todo o caso, posso dar o meu testemunho de que, nos anos recentes, no âmbito do FMI e do G20, a atuação conjunta dos Bric tem sido de grande importância prática.

Por exemplo, os diretores executivos desses países no FMI reúnemse periodicamente. Não tem sido difícil definir posições comuns para grande parte dos temas centrais da agenda do Fundo. Os ministros de Finanças e presidentes de Banco Central dos Bric têm-se encontrado periodicamente. O próximo encontro será na semana que vem, por ocasião das reuniões de Primavera do FMI, aqui em Washington.

No comunicado divulgado pelos líderes dos quatro países, após a reunião de Brasília, há vários aspectos importantes relacionados à governança global e temas econômicos e financeiros internacionais (a íntegra do comunicado pode ser encontrada na página do Itamaraty na internet, www.mre.gov.br).

O espaço não permite discutir todos esses aspectos. Puxando a brasa para a minha sardinha, destaco apenas um: o compromisso de lutar por uma conclusão ambiciosa nas reformas em andamento no FMI e no Banco Mundial com o objetivo de reduzir o “déficit de legitimidade” dessas instituições. Isso requer, antes de tudo, “uma transferência substancial de poder de voto em favor das economias emergentes e dos países em desenvolvimento de forma a alinhar a sua participação na tomada de decisões ao seu peso relativo na economia mundial”. Se isso não acontecer, continua o comunicado, essas instituições correm o risco de se tornar obsoletas.

A frase seguinte do documento tem um significado especial: “No interesse de promover a estabilidade econômica internacional, pedimos a nossos ministros de Finanças e presidentes de Banco Central para examinar os arranjos monetários regionais e discutir modalidades de cooperação entre nossos países nessa área.” Para bom entendedor…

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. é economista e diretor-executivo pelo Brasil e mais oito países no Fundo Monetário Internacional, mas expressa os seus pontos de vista em caráter pessoal. Email: [email protected].

 

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