O julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 54 teve início na quarta-feira (11) e foi encerrada apenas no dia seguinte. Em seu voto, o relator do processo, ministro Marco Aurélio de Mello, disse que “o anencéfalo jamais se tornará uma pessoa” e que o tema não se trata de “vida em potencial, mas de morte segura”. O ministro também enfatizou o direito ao livre arbítrio da mulher quanto à continuidade deste tipo de gestação. “Cabe à mulher, e não ao Estado, sopesar valores e sentimentos de ordem estritamente privada, para deliberar pela interrupção, ou não, da gravidez”, afirmou Mello.
O ministro Carlos Ayres Britto, cujo voto acompanhou o do relator, comparou a gestação de anencéfalo à prática de tortura. “Levar às últimas consequências esse martírio contra a vontade da mulher corresponde a tortura, a tratamento cruel. Ninguém pode impor a outrem que se assuma enquanto mártir. O martírio é voluntário”, disse Britto.
Parlamentares petistas elogiaram a decisão, considerada um importante avanço nos direitos das mulheres.
“O STF está de parabéns pela lucidez e sensibilidade que tiveram neste julgamento. É uma desumanidade impor à mulher a obrigação de gestar um feto que não conseguirá sobreviver”, disse a deputada Fátima Bezerra (PT-RN).
O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) também avalia positivamente o julgamento do Supremo. “O STF acertou ao considerar que o feto anencéfalo não pode se tornar um ser humano e a decisão, portanto, valoriza a vida das mulheres, que passam por um sofrimento muito grande com esse tipo de gestação”, afirmou Teixeira.
A deputada Janete Rocha Pietá (PT-SP) entende que esta situação não pode ser chamada de aborto, mas de interrupção de gravidez. “Não se trata de aborto, já que o aglomerado de células não desenvolveu o cérebro, órgão que é imprescindível á vida humana, já que é ele que coordena a respiração, os movimentos e outras funções vitais”, declarou a parlamentar.
Janete Pietá, coordenadora da Bancada Feminina na Câmara, lembrou que não há consenso entre as deputadas federais, mas se disse favorável à decisão do STF. “Fico feliz com a decisão do Supremo porque isso vai aliviar o sofrimento das mulheres que têm essa infelicidade. Quando uma mulher engravida, toda a família se envolve no processo e se prepara para receber a nova vida. No caso de um feto anencéfalo, a família vai preparar o quê? Um caixão?”, questionou Janete.
“A decisão não impedirá que as mulheres com fortes convicções religiosas possam manter a gravidez de um feto anencéfalo até o final. Mas é importante garantir o direito de interrupção de gravidez àquelas mulheres que assim desejarem”, frisou Janete.
O deputado Amauri Teixeira (PT-BA) disse que a decisão do STF “não podia ser diferente, não podemos ter uma posição de fanáticos nessa questão”. Para ele, “um feto sem cérebro não é um ser humano” e impor à mulher a “obrigação de carregar no seu ventre um aglomerado de células que não é um ser humano é uma indignidade”.
Usurpação – O deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), contrário à decisão, criticou o STF pelo que chamou de “usurpação das prerrogativas de legislar” do Congresso Nacional. “Mais uma vez isto ocorre. Basta ler o voto do ministro Lewandowski para entender o que venho afirmando sobre isto. Como confiar num Tribunal que rasga a Constituição e defende a morte antecipada de uma criança em gestação, unicamente dependendo da vontade de sua mãe?”, questionou Fonteles.
Rogério Tomaz Jr.