O silêncio de Dilma – Paulo Delgado*

paulo delgado-ARTIGOEm artigo, o deputado Paulo Delgado (PT-MG) discorre sobre o estilo da presidente Dilma Rousseff. “O silêncio e a discrição da presidente devem ser entendidos como um encorajamento a formas virtuosas de gestão do Estado com reflexos positivos no comportamento da economia e no destino da vida dos cidadãos”.

O artigo foi publicado no jornal O Globo. Leia a íntegra:

O silêncio de Dilma

Paulo Delgado*

Muita coisa muda na percepção da política, suas luzes e sombras, de um tempo a outro. Há épocas de ação, outras de quietação. Ambas relevantes: tempos de lua de mel seguidos de desescalada emocional. Qualquer governo que suceda a um governo popular é pressionado pelo desejo de consagração e não há bússola que o livre da comparação. Errada, nesse caso, pois a escolhida para a sucessão, pelo seu partido e pelas urnas, o foi exatamente pela discrição diante da política.

Muito ruido por nada. Mas três atores tagarelas despontam no primeiro mês de governo da presidente Dilma. Acostumados ao mundo do semipermitido e do semiproibido que impera nesse país. Nação que vive a ansiedade do “pai na maternidade”, sempre no corredor aguardando o que vai acontecer dali a pouco com a pátria amada, como se não tivesse nada a ver com aquilo que vai nascer.

Os sindicalistas: de tão fortes e prestigiados não aceitam mais as razões do Estado e têm seu próprio salário mínimo, suas leis, para impor ao governo que apoiam, dependem e não vivem sem. Privilegiados, não abrem mão da sensação de vítimas. Num governo injusto um sindicalista deve ser um segundo governo, mas num governo democrático em que os sindicatos prosperam comodamente é difícil imaginar que sua devoção pela luta salarial e restrições à livre contratação do trabalho tenha por base o discernimento contábil ou defesa do pleno emprego.

A política parlamentar: distorção da identidade, é um barco à deriva que navega pelo parlamento com os 22 partidos que o compõem. Há desapontamentos, desilusões e frustrações que devem ser creditados mais aos próprios partidos e seus políticos do que ao governo, seu estilo ou ritmo. Produziu-se uma correlação direta entre o declínio da imagem pública e a pressão desabrida por cargos. O pior da política de cooptação que inunda as alianças governistas desde a redemocratização é que não só produz provas incomodas para seus personagens como avança e gera desconfiança e incerteza para o governo.

Fazenda e Banco Central : irmãos siameses sempre em contradição e desconfiança mútua. Todo governo razoável quer ampliar a oferta de bens e serviços para o maior número de pessoas, clientes, aliados, eleitores, cidadãos. É natural e próprio da função. É a Fazenda que autoriza o gasto, com base no realismo das contas públicas. Quando todo o mundo foi obrigado a praticar juro zero por causa da crise econômica, insistimos no juro alto para sustentar gasto alto e real sobrevalorizado. Aumentaram a demanda e a pressão por crédito, o consumo explodiu e esquentou o corpo da economia com a febre da inflação. Aumentou a tensão entre o acelerador da Fazenda e o freio do Banco central. Se você solta os gastos, eu subo os juros, diz o ministro da moeda para o da Fazenda. Ainda mais quando o consumidor, entupido de crédito, transformou-se de convidado para gastar em acionista do modelo gastador.

É sabido que é necessário haver menos gasto para haver menos juros, investimento de qualidade, menos inflação. Corrigir distorções é melhorar o modelo econômico dando-lhe estabilidade e consistência para permanecer e crescer.

O silêncio e a discrição da presidente devem ser entendidos como um encorajamento a formas virtuosas de gestão do Estado com reflexos positivos no comportamento da economia e no destino da vida dos cidadãos. Políticas de inclusão serão modernizadas para assegurar consistente mobilidade social. Se vincularão fortemente ao universo da responsabilidade pelo trabalho com recompensa pelo esforço. Investimentos e realizações de longo prazo, educação, infraestrutura, talentos, inovação, simplificação e razoabilidade tributária e fiscal, modernização do mercado interno, inflação sob controle etc.

Como o animus reivindicativo, trabalhista e político, sindical e partidário quer influenciar na qualidade da agenda do governo que se inicia? Ou só lhes interessa fartar-se em quantidade?

PAULO DELGADO é sociólogo e deputado federal (PT-MG).

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