Não há dolo, não há crime, apenas vontade política para destituir um governo, sustenta Cardozo

cardozo zeca ribeiro

 

O advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, em mais uma defesa contundente na comissão especial que analisa a admissibilidade do processo de impedimento da presidenta Dilma Rousseff, ao pedir a nulidade do processo fez um alerta aos parlamentares atentos que o acompanharam nesta terça-feira (11), na derradeira sessão do colegiado. “A história não perdoa e não perdoará, no Brasil, que uma senhora presidenta da República legitimamente eleita seja afastada por um relatório que não se sustenta minimamente nas suas premissas”, argumentou Cardozo.

“Defendo a nulidade desse processo, a improcedência das denúncias por aquilo que determina a Constituição do Brasil”, sustentou, referindo-se ao artigo 85 da Constituição Federal que estabelece quais são os crimes de responsabilidade em que os legisladores devem se ater para propor um pedido de impedimento. Ele sustentou que o processo é nulo pelos vícios que o caracterizam e pela improcedência das denúncias ofertadas.

Cardozo disse ainda ter convicção, após ter feito uma leitura isenta e desapaixonada, que o relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO) talvez seja a maior peça de defesa que a presidenta da República possa ter. “Suas contradições, os equívocos conceituais, o incontido desejo político de se chegar ao impeachment, deixam claro os fatos que ensejaram a abertura deste processo”, denunciou o ministro.

Lembrou ainda Cardozo que a legislação que estabelece dispositivos para a cassação de um parlamentar é a mesma exigida para a cassação de um presidente da República. “Eu não peço privilégio. Peço igualdade. Ou seja, será que esse dispositivo foi revogado do artigo 5º da Constituição? Será que vige a ironia do George Orwell, na Revolução dos Bichos – quando diz todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais que os outros. Será isso?”, questionou.

Todo esse contexto relaciona-se ao fato de o relator, além de não ter levado em consideração a peça de defesa da presidenta Dilma, também cerceou o direito de defesa por parte de seus advogados em uma das reuniões da comissão. “O fato de a defesa não ter sido intimada, o fato de o advogado não poder ter feito uma questão de ordem que lhe faculta a lei, traz nulidade ao processo”, alertou o ministro.

Credito suplementares – Cardozo citou ainda o fato que o deputado Jovair Arantes sustenta em seu relatório de que houve, por parte do governo, a abertura de créditos suplementares sem autorização legislativa. Para o ministro, essa é uma argumentação inócua porque não há ilegalidade nos decretos assinados. “Eles foram baseados no artigo 4º da Lei Orçamentária. É fato. O argumento que o relator utiliza para refutar isso é que teria que demonstrar que esses decretos tinham compatibilidade com as metas fiscais de acordo com o anexo baixado na Lei de Diretrizes Orçamentária. Porque vossa excelência desprezou essa evidência solar?”, indagou Cardozo.

Frisou o ministro que o relatório de Jovair Arantes, de 150 páginas, não se fundamenta no direito. “O que se quer é o impeachment. Para isso, não importa se eu rasgo a Constituição ou se violento a democracia. É isso que o relator expressa em seu relatório e é por isso que eu digo que esse relatório é uma peça de absolvição histórica de uma presidente da República”, reafirmou o ministro Cardozo. “Ele demonstra que não há dolo, que não há crime, demonstra que apenas há vontade política, como se no parlamentarismo nós estivéssemos para destituir um governo, mas não há base para isso”, ponderou.

Mão invisível – Cardozo também fez uma dura crítica àquilo que classificou de “mão invisível” que atuou por traz do relatório de Jovair Arantes. “Eu defendo que esse processo foi instaurado com desvio de poder e que durante toda sua tramitação também houve desvio de poder por meio de uma mão invisível, ou talvez visível, que faz com certos processos andem muito rápidos e outros não andem. Que faz com que certos processos tenham violação da grande defesa”, denunciou, se referindo à interferência direta do presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) em todo o processo.

Na avaliação do ministro, é inadmissível que em um país, historicamente marcado, desde o seu descobrimento, por uma corrupção estrutural e sistêmica “uma presidenta da República eleita legitimamente seja afastada por uma operação contábil que era aceita pelos tribunais e que não foi acusada nesse processo de ter se locupletado de um centavo sequer”.

“Eu defendo que isto contraria a Constituição e ao Direito. Portanto, o impeachment viola sim a Constituição, a democracia, e o Estado de Direito . Eu defendo que esta violação jamais fará surgir, seja quais forem as pessoas envolvidas, um governo que tenha legitimidade para governar. A história não respeita violência à democracia, especialmente um povo que lutou para tê-la”, finalizou o ministro da Advocacia Geral da União.

Benildes Rodrigues
Foto: Zeca Ribeiro/Agência Câmara

 

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