Noeme Ferreira, responsável pelo Centro Espírita Afro-Brasileiro Ilé Axé Iemanjá Ogum Té, localizado em Valparaíso de Goiás, entorno do Distrito Federal, se deparou, ao voltar de viagem na semana passada, com uma triste cena: o terreiro de candomblé havia sido invadido e completamente depredado.
Sua casa e o barracão que abrigava os objetos sagrados e os altares foram completamente destruídos. As paredes estavam todas no chão. No local, havia um bilhete com nome de uma instituição evangélica.
Casos de desrespeito e de intolerância religiosa, como o sofrido por Noeme, vêm se tornando comuns no Brasil. Segundo dados da Fundação Cultural Palmares (FCP), o templo em Valparaíso de Goiás foi um dos 21 depredados, saqueados ou queimados no DF e entorno desde o ano passado. Em 2015, o Disque 100 (do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, Juventude e dos Direitos Humanos) registrou 705 crimes de intolerância religiosa entre atos de vandalismo, perseguição e racismo no Brasil.
A luta contra a intolerância religiosa é uma das pautas prioritárias do Ministério da Cultura (MinC). Na quinta-feira (17), a FCP e o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico nacional (Iphan) promoveram, em Brasília, ato em desagravo à recorrente violência contra as casas de religião de matriz africana. Estiveram presentes o ministro da Cultura, Juca Ferreira, a presidenta da FCP, Cida Abreu, o diretor de Patrimônio Imaterial do Iphan, TT Catalão, e diversos líderes religiosos.
Durante o ato, o ministro Juca Ferreira enfatizou que o MinC tem a missão de cuidar das expressões simbólicas do País. “O Estado, por meio do Ministério da Cultura, tem a obrigação de defender a diversidade e as manifestações culturais do Brasil. O Brasil é um dos países mais diversos do mundo e é preciso zelar por isso”, pontuou.
Juca Ferreira também falou sobre o momento “difícil” vivido pelo País, com “afloramento de doenças sociais como a discriminação, a homofobia e o racismo”. “Minha posição pessoal é a de que o Brasil tem sido muito leniente com essas enfermidades. Conheço de perto o candomblé e é uma religião que vem da África e, por isso, (entre outros motivos) há destruição de terreiros”, disse. “Sou solidário e, sempre que posso, defendo a necessidade de combater essas enfermidades”, completou.
A presidente da FCP, Cida Abreu, enfatizou que a luta contra a intolerância religiosa é agenda prioritária da fundação e frisou a difícil conjuntura política e social atual. “O Brasil é um país diverso, continental, não dá para falar que uma fé é maior que outra. Não podemos deixar essa bandeira da intolerância ganhar força”, ressaltou.
O ato de desagravo ocorreu após visita à exposição Patrimônio Imaterial Brasileiro – A Celebração Viva da Cultura dos Povos, na Caixa Cultural Brasília. Para o diretor TT Catalão, fazer o ato de desagravo no local da exposição tem um significado especial.
“É uma exposição que celebra a diversidade cultural brasileira e, quando se fala em intolerância e racismo, é a diversidade que está sendo agredida. É impedir a convivência com o diferente. E isso não pode acontecer”, considera.
(Das agencias)