O deputado Henrique Fontana (PT-RS), em entrevista ao portal Sul21, publicada nesta semana, dá o tom do que significou o ano de 2015 para o Brasil diante de uma oposição inconformada com o resultado das urnas e determinada a prolongar indefinidamente a tentativa de realizar um terceiro turno das eleições que reconduziram Dilma Rousseff à Presidência da República. Na entrevista, Fontana chama a atenção para o alto custo social, político e econômico da tentativa de derrubar Dilma Rousseff, a partir de uma ação patrocinada por setores oposicionistas liderados pelo PSDB. “É uma espécie de vale tudo para interromper o mandato eleito democraticamente da presidenta Dilma Rousseff. Esses mecanismos deixam sequelas extremamente negativas para o tecido democrático, para a economia do País, para a governabilidade e para a vida das pessoas de modo geral”.
Leia a seguir a íntegra da entrevista:
A última quinta-feira pode ter marcado uma espécie de encerramento do ano político, com o julgamento do rito do impeachment no Supremo Tribunal Federal. Como avalia o resultado desse julgamento que zerou o processo de impeachment na Câmara, considerando o clima de acirramento político no país, que só aumentou no decorrer do ano?
Seguramente, o maior problema que o Brasil está vivendo é a crise política que ele enfrenta. Essa crise política tem, obviamente, múltiplas causas, mas ela tem uma causa central e estrutural, que é a decisão da oposição de não aceitar o resultado da eleição. Isso gerou um conjunto de capítulos ao longo do ano, o chamado terceiro turno de uma eleição que nunca termina e que tem um custo social, político e econômico muito grande para o país. Obviamente que a crise econômica tem outras causas também, mas não há dúvida que esse ambiente de intolerância, de ódio, de conflitividade política fora dos padrões desejados para um ambiente democrático vem sendo fortemente alimentado por uma parte da oposição que, infelizmente, hegemoniza essa oposição e mantém um terceiro turno que nunca termina.
É uma espécie de vale tudo para interromper o mandato eleito democraticamente da presidenta Dilma Rousseff. Esses mecanismos deixam sequelas extremamente negativas para o tecido democrático, para a economia do País, para a governabilidade e para a vida das pessoas de modo geral. Esse nível de conflitividade beirando a intolerância no convívio entre oposição e governo está gerando prejuízos muito grandes.
Este cenário, ao longo do ano, encontrou um ator privilegiado: Eduardo Cunha, um dos políticos mais corruptos de que se tem notícia na história do País. É um político que se constituiu naquilo que é o melhor exemplo de um político de negócios, fenômeno que ocorre dentro da nossa sociedade. Ele se criou à sombra, foi crescendo desta forma e, neste ambiente, ele encontrou seu melhor momento. A eleição dele para a Presidência da Câmara já teve muito a ver com essa ideia do vale tudo para derrotar o governo Dilma. Tivemos votos movidos por isso, que se somaram a um conjunto de votos de defensores de uma pauta ultraconservadora e aos políticos de negócios dentro de um ambiente de financiamento eleitoral como nós temos, alimentando um clima de crise política permanente.
De algumas semanas para cá, especialmente, vivemos um clímax desta tentativa de golpe institucional. Na antevéspera da assinatura de um dos tantos pedidos de impeachment que foram feitos, o PT tomou a mais importante decisão do ano, resolvendo uma tensão que perdurou muito tempo dentro do partido, desde a pré-candidatura de Arlindo Chinaglia para a Presidência da Câmara, que eu apoiei com toda a convicção, por entender que nós deveríamos dar combate a essa política inaceitável de intolerância, que protege um conjunto de mecanismos de corrupção, representada pela candidatura de Eduardo Cunha.
Olhando hoje, retrospectivamente, para esse momento no início do ano, você segue achando que a candidatura de Chinaglia foi um acerto?
Sim. Eu digo isso não porque já tinha essa opinião, mas a partir de uma leitura histórica dos fatos. Eu tinha convicção de que a candidatura Chinaglia era indispensável para o campo progressista já naquele período. Naquela época alguns diziam que, como Eduardo Cunha estava muito fortalecido, por diversos motivos que já citei aqui, o melhor seria adotar uma postura pragmática e fazer um acordo na lógica do menos ruim. Imagine o desastre que seria para a esquerda e para o campo progressista se o PT tivesse marchado numa candidatura junto com ele. O tempo mostrou que tudo o que ele vinha para fazer, como presidente da Câmara, era organizar a oposição ao nosso governo e patrocinar um conjunto de pautas conservadoras e de retrocessos para a sociedade.
Nestas últimas semanas houve uma tomada de posição, pela qual eu trabalhei muito junto com um conjunto de companheiros dentro do partido, para que esse fosse o nosso caminho. Era preciso deixar claro para a sociedade como está sendo construída a ideia desse golpe, quem são os promotores deste golpe e de que maneira agem. A chantagem estava posta por Eduardo Cunha e seus aliados. Essa decisão de explicitar o conflito com ele tem um conjunto de significados. Em primeiro lugar, tornou mais clara a aliança mais ou menos explícita que ele tem com a oposição, com o PSDB, com o PPS, com os Democratas e com esses setores que querem derrubar a presidenta Dilma Rousseff.
Um fato irônico ilustra bem essa aliança. Há cerca de vinte dias, saímos todos do plenário numa marcha, no dia em que ele cancelou a reunião do Conselho de Ética. Estavam juntos na marcha deputados do PSDB, do PPS, Democratas, um grupo grande de deputados do PT, do PCdoB e do PSOL. Todos diziam que Eduardo Cunha não podia mais presidir uma única reunião do Parlamento. Era um consenso. No dia seguinte, ele decide assinar o pedido de impeachment, numa evidente retaliação. Ao fazer isso, recebeu um silêncio conivente dos parlamentares da oposição que deixaram de subir à tribuna e de dar entrevistas nos dias seguintes para pedir o afastamento dele da Câmara, em troca da possibilidade de levar o golpe adiante. Nesta conjuntura, também ocorreu algo saudável com o PMDB ,que, finalmente, teve que decidir quem é governo e quem está a favor do golpe.
Tudo isso desencadeou um processo de disputa muita intensa no Parlamento e na sociedade, e o Supremo foi chamado a exercer seu papel. O PSDB, o PPS e o Democratas esqueceram seus compromissos com um mínimo de respeito ao Estado Democrático de Direito e aplaudiram as decisões arbitrárias de Eduardo Cunha na abertura do processo de impeachment, que envolve a votação mais grave que um parlamento pode fazer.
Trata-se da intervenção de um poder em outro, onde 513 deputados e 81 senadores podem substituir a vontade de 54 milhões de eleitores. É uma votação gravíssima, portanto. Há um primeiro fato que deslegitima totalmente esse pedido de impeachment. A primeira assinatura é a de um político absolutamente sem credibilidade, que virou um símbolo da corrupção no país.
É esse político que quer derrubar uma presidenta, que pode acertar ou errar na política, mas cuja história de vida é marcada pela honestidade. Além disso, não há nenhum crime de responsabilidade apontado que a presidenta tenha cometido. É difícil que alguém com bom senso concorde com isso.
O segundo é o modo como ele conduziu a abertura do processo de avaliação do pedido de impeachment. Ele o fez de modo absolutamente autoritário e imperial, sem passar a palavra para ninguém e determinando, de modo autocrático, que a votação fosse secreta, montando um esquema de chapas avulsas para constituir uma maioria pró-impeachment na comissão. Para isso, contou com a conivência da oposição. Não adianta os representantes do PSDB, PPS, DEM e de setores de outros partidos dizerem, de forma cândida, que o Eduardo Cunha só assinou e que, dali em diante, que vai decidir são os demais parlamentares. Na verdade, ele está no centro dessa articulação. Aliás, eu não vi uma única frase crítica do vice-presidente Michel Temer sobre o vice Eduardo Cunha, o que é um silêncio bastante revelador.
Em sua opinião, a inexistência de um crime de responsabilidade claramente tipificado no pedido de impeachment que tramita na Câmara é suficiente para barrar a iniciativa da oposição? Como enfrentar os discursos políticos que acompanham essa iniciativa contra a presidenta Dilma Rousseff?
Como disse recentemente o ministro Miguel Rossetto, nós estamos vivendo uma das investigações mais profundas sobre corrupção da história do Brasil. Não porque exista mais corrupção hoje do que existia anteriormente, mas sim porque os órgãos e mecanismos de investigação foram fortalecidos e estão sendo apoiados. O Brasil melhorou institucionalmente com o papel do Ministério Público, da Polícia Federal e de outros órgãos. Dilma Rousseff, como presidenta da República, naquilo que são as suas responsabilidades institucionais toma todas as medidas cabíveis para garantir um ambiente positivo de apoio a essas investigações. Não há um único ato dela onde tenha, por exemplo, transferido um delegado da Polícia Federal para coibir investigações. Além disso, nas milhares de horas de gravações de depoimentos nas distintas operações em curso, não há um minuto sequer que levante uma acusação contra a presidenta Dilma. Ou seja, querer abrir um processo de impeachment nestas condições é expressão da pura vontade de derrubar um governo.
Esta semana li um artigo do presidente da Fiesp, Paulo Skaff, na Folha de São Paulo. É um artigo de opinião onde ele diz que acha que determinada política está errada, que o País está sofrendo uma redução da atividade econômica. Ele tem todo o direito de emitir as suas opiniões, mas isso não é justificativa para um impeachment. Na mesma linha, lideranças como Fernando Henrique Cardoso, José Serra e Aécio Neves se abraçam à lógica do vale tudo e cultivam um silêncio conivente em relação a Eduardo Cunha para chegar ao poder sem votos. A decisão do Supremo na última quinta-feira colocou mais um carimbo de ilegitimidade nestas iniciativas. Como é que vou admitir que a votação na abertura de processo de impeachment seja? Acho uma irresponsabilidade esse processo ter sido aberto, pois ele está dividindo o país, atrapalhando enormemente a economia brasileira e alimentando uma crise política que nunca termina.
Um dos argumentos que embasam o pedido de impeachment acusa a presidenta Dilma Rousseff da prática de “pedaladas fiscais”. O significado disso é desconhecido pela maioria da população. Qual seria exatamente o crime envolvido nas tais pedaladas?
Aquilo que estão chamando de “pedaladas”, expressão que é uma criação do marketing político, nada mais é do que um atraso temporário de recursos que são repassados do orçamento geral da União para os bancos públicos que fazem o pagamento de uma série de programas sociais, como o Bolsa Família. Este período que o governo federal atrasa o repasse é remunerado com juros e correção monetária. E o que é mais importante, politicamente falando, isso sempre foi feito por todos os governos e é feito hoje pela maioria dos governos estaduais.
É aquela história dos dois pesos, duas medidas. Como para a presidenta Dilma funciona o vale tudo para cassar o mandato dentro de um ambiente de golpe, até isso vira motivo para cassação. Mas mesmo em relação a essa tecnicalidade, que por si só não deveria valer, o Tribunal de Contas da União poderia dizer, por exemplo, que, a partir do ano que vem, essa prática deve ser considerada crime de responsabilidade. Então, o Congresso teria que votar uma lei dizendo que um eventual atraso de repasses seria um crime de responsabilidade. E não decidir casuisticamente dizendo que essa prática que eu aceitei no passado, no governo Fernando Henrique, agora, no governo Dilma, eu não vou aceitar. É absolutamente injusta e inadequada a forma como isso foi feito.
Outra coisa importante que foi definida pelo voto do Supremo é que o crime de responsabilidade, que eu entendo que não ocorreu, tem que ser apresentado com toda nitidez, de acordo com a tipificação especificada na lei de impeachment, de 1950, e não pode estar baseado numa invenção como esta das pedaladas, ainda mais relacionada ao ano de 2015, um ano que ainda nem terminou. Tem que ser mandato atual e tem que ser um crime de responsabilidade doloso. Qualquer pessoa de bom sendo sabe que um presidente da República não pode ser responsabilizado por todos os atos que todos os agentes públicos praticam durante o seu governo. O impeachment é um processo político e jurídico também. Não estamos vivendo em um parlamentarismo ou em um presidencialismo com “recall”, onde é possível fazer uma análise política de um governo, por meio de uma moção de desconfiança. No parlamentarismo, da mesma forma que o Parlamento tem o direito de dizer que o primeiro ministro perdeu a confiança, este pode dissolver o Parlamento e convocar novas eleições.
É impressionante a forma virulenta e odiosa com que alguns criticam a presidenta Dilma sobre essas questões de corrupção, de uma maneira totalmente seletiva e desequilibrada. Contra ela, não há nenhuma prova de desvio de nenhum recurso público. Sobre ela pesa o ponto positivo de que está garantindo todo esse ambiente de investigação, inclusive enfrentando uma crise política, onde determinados setores até gostariam que ela intervisse nestas investigações para protegê-los. Um exemplo disso foi o próprio Eduardo Cunha, que levantou a hipótese de que a ação do Procurador Geral da República teria sido tomada em conluio com o governo, uma acusação que não para de pé, mas que ele levantou. Quem, de fato, quer combater a corrupção deve se preocupar em manter o estado democrático de direito. O contrário disso poderia desestabilizar os processos de investigação que estão em curso.
Em sua opinião, há algum risco disso acontecer?
O Eduardo Cunha vem trabalhando com esse cenário. O que ele pensou? Vou patrocinar esse processo de impeachment para derrubar a presidenta Dilma, o que vai gerar bastante fumaça na sociedade e permitirá que eu me esconda por trás dessa fumaça, tirando o foco do noticiário sobre contas na Suíça e outros temas relacionados. E depois, quando o Michel Temer assumir, poderei buscar um ambiente muito mais propício para me proteger e evitar uma eventual cassação de mandato e uma posterior prisão. As pessoas têm que levar em conta todos esses movimentos e cenários. Na minha opinião, a baixa adesão dos mais recentes protestos de rua convocados pelos defensores do impeachment e do golpe tem a ver com a progressiva compreensão na sociedade de que essa proposta não soluciona nenhum dos problemas do Brasil. Ao contrário, só os agrava.
Há quem estabeleça comparações entre o processo atual e aquele que envolveu o ex-presidente Collor. Na sua avaliação, há algum termo de comparação entre os dois casos?
Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Contra o Collor havia várias acusações de enriquecimento ilícito, roubo e corrupção envolvendo diretamente o chefe do Executivo. Contra a Dilma não há nenhuma acusação deste tipo, muito menos alguma prova. A segunda diferença enorme é que, contra o Collor, se constituiu quase que uma unanimidade social. Já para se discutir o impeachment da Dilma o país se divide ao meio. Lideranças políticas como a Marina Silva, para citar apenas um exemplo, não estão apoiando o impeachment. Cada vez mais, pessoas que têm uma posição de centro no cenário político nacional percebem que essa briga política interminável não é razoável em um processo democrático. Nenhum país aguenta ficar quatro anos em um ambiente eleitoral. Há tempos para eleições e tempos para governos.
A democracia demanda isso. Eu já perdi eleições e aceitei o resultado. Dias atrás, em um debate com um integrante do PMDB gaúcho, quando ele foi perdendo seu estoque de argumentos, citou a baixa popularidade da Dilma como justificativa para o impeachment. Aí perguntei para ele: mas então, você quer propor o impeachment do Sartori? Eu também estou muito insatisfeito com o governo Sartori. Acho que o governo dele está errando muito, mas preciso esperar a próxima eleição para apresentar uma candidatura e tentar ganhar uma eleição. Esta regra tem que valer para a presidenta Dilma também.
Quando esteve em Porto Alegre na semana passada, Ciro Gomes afirmou que há uma aliança política entre o vice-presidente Michel Temer e Eduardo Cunha para tentar derrubar a presidenta Dilma. Qual sua opinião sobre a conduta do vice-presidente Michel Temer no atual cenário político nacional?
Em minha opinião, ele está errando muito e prejudicando os maiores interesses da democracia brasileira. Na semana passada, eu jantei com o senador Lindbergh Farias, em Brasília, e ele lembrou um fato ocorrido durante o processo de impeachment do Collor. Na época, Lindbergh era líder estudantil e quis procurar o vice-presidente Itamar Franco para uma conversa. Itamar disse a ele então que estava bastante retirado do debate sobre o impeachment exatamente pela função institucional que ele ocupava no país naquele momento. Essa é uma lição de como o vice-presidente Temer deveria agir, ao menos em parte de sua ação política. Eu esperaria até mais da atividade dele. As manobras grosseiramente inconstitucionais que o Eduardo Cunha está patrocinando para tentar levar em frente esse golpe deveriam ser denunciadas por ele, como jurista e constitucionalista que é. Para não falar do fato de que ele foi eleito junto com a presidenta Dilma. Eu participei e apoiei essa aliança e votei nele. Acho que suas ações têm misturado um silêncio incompreensível sobre muitos assuntos, como acerca do papel de Eduardo Cunha na atual conjuntura brasileira, com uma falta de participação mais ativa na disputa em curso.
É evidente que toda crítica deve ser respeitada, mas a carta que o vice-presidente escreveu deixou de fora o essencial. Como assim que ele se sentiu desprestigiado se o partido que ele representa ocupa sete ministérios no governo? Ele concorreu e trabalhou dentro do PMDB para ser o candidato a vice-presidente. Isso é o essencial e não se o ministro “a” foi substituído pelo ministro “b”. Tanto a presidenta apostou nas relações com ele que o nomeou coordenador político do governo. Pelo que vemos agora, não deveria ter feito isso. Nas últimas semanas, ele está agindo numa posição muito mais anti-governo, pró-impeachment e pró-golpe do que no sentido inverso. Então, considero que a ação dele está marcada por um conjunto de erros políticos, especialmente neste último período.
Como avalia a disputa política dentro do PMDB entre o grupo que apoia a presidenta Dilma e grupo que aderiu ao movimento do impeachment?
Essa disputa envolve um jogo de xadrez muito difícil. Há uma grande divisão dentro do partido. Sempre houve cerca de um terço da bancada do PMDB que é anti-Dilma. O PMDB gaúcho é uma representação clara disso, com exceção do deputado José Fogaça. Mas eu considero que essa nitidez é positiva para a democracia brasileira. Uma parte do PMDB é governo, mas outra parte vota e trabalha contra o governo. Então, quem trabalha contra o governo deve assumir que é da oposição. Ao longo dos últimos anos, o PMDB é aquele partido que consegue ser governo e oposição ao mesmo tempo, qualquer que seja o governo. Isso não é algo bom para a democracia. Agora, nós devemos cuidar da aliança com esse pedaço do PMDB que está nos apoiando. Já que uma parte da oposição está obcecada com a ideia do golpe, nós devemos nos precaver de todas as formas. Mas eu tenho convicção que esse golpe não vai prosperar.
A maioria do PMDB gaúcho, como você referiu, aderiu a uma posição anti-Dilma. E o governador Sartori, questionado sobre a proposta de impeachment, disse que iria assumir uma posição de neutralidade no caso. Como avalia essa posição do PMDB gaúcho e, mais particularmente, do governador Sartori?
Eu não gosto do discurso de neutralidade adotado pelo governador Sartori. Considero uma enorme irresponsabilidade a maneira como esse processo de impeachment entrou na conjuntura política do país. Por isso mesmo, defendo que devemos acelerar a resolução dessa crise. Provavelmente serei derrotado na minha tese, mas estou defendendo que, idealmente, não deveríamos ter recesso. É evidente que uma crise deste tamanho, que vem sendo cultivada pela oposição, precisa ser superada o quanto antes. E quando formos decidir essa crise, não tem voto neutro. Ou eu entendo que há motivo para pedir o impeachment da presidenta Dilma ou que não há motivo. Então, um líder político que é governador de um Estado, deve ter opinião sobre um fato tão grave. Se não parece estar seguindo a política de acender uma vela para cada santo. Há um conjunto grande de governadores do PMDB e do PSB que já se declararam contra o impeachment. Espero que o governador Sartori se posicione a respeito do impeachment.
Recentemente, a Fiesp manifestou-se oficialmente a favor do impachment. Há quem acredite que alguns setores empresariais estão promovendo uma espécie de lockout, segurando os investimentos e apostando no impasse econômico para derrubar a presidenta Dilma. Como vê a postura do setor empresarial na crise atual?
Penso que posturas como a de Paulo Skaff (presidente da Fiesp) são muito negativas indesejáveis, pois impõem uma espécie de chantagem econômica sobre a democracia. Aliás, esse é um problema mundial hoje. Uma das maiores sequelas da hegemonia ultraliberal e de todo esse arcabouço da financeirização da economia, são essas chantagens que o chamado mercado impõe à democracia. O próprio ex-presidente Fernando Henrique tocou nesta banda ao dizer que o mercado estaria fazendo leituras sobre o que é bom para a democracia do país, se é melhor ter ou não impeachment. Na lei de 1950 não está escrito que um dos motivos que pode levar à cassação do mandato de um presidente eleito pelo voto popular são os humores do mercado. Alguns setores do empresariado aderiram a essa onda golpista, mas percebo que estão refluindo, pois percebem que podem estar embarcando numa aventura, prejudicando a economia, pois esta também vive de expectativas.
Uma última pergunta sobre a política local. O PT de Porto Alegre apontou o seu nome, juntamente com os de Raul Pont e Maria do Rosário, como possíveis candidaturas do partido à eleição municipal de 2016. Como recebeu essa indicação e qual sua avaliação sobre o cenário que está se desenhando para o ano que vem?
Em primeiro lugar, penso que o momento exige de todos nós uma concentração de 98% para enfrentar essa tentativa de golpe que pode deixar graves sequelas na sociedade brasileira. O golpe militar de 64 deixou sequelas durante décadas no Brasil. Ontem mesmo (quinta-feira à noite), enfrentei uma situação no aeroporto Salgado Filho que mostra bem os riscos que estamos correndo se esse grupo radicalizado com um discurso de ódio e intolerância conseguir vencer essa batalha. Eu me senti fortemente agredido quando cheguei ao aeroporto. Não se tratava de alguém querendo criticar a minha opinião política. Se fosse isso, não teria problema, pois faz parte da minha atividade política. O que vi foram pessoas movidas por um ódio muito grande que vieram para me agredir e me ofenderam pessoalmente. Temo que esses sinais de ações fascistas que estão aparecendo cresçam muito, o que seria ruim para toda a sociedade. O ódio e a intolerância são ruins em qualquer hipótese. Alguns parecem que esquecem ou não aprenderam as lições históricas que já tivemos sobre isso.
Então, acho que devemos nos concentrar fortemente neste tema. Estou muito otimista em relação a isso. Sinto que, tanto na sociedade como no parlamento, caminhamos para uma vitória e a democracia e o estado democrático de direito serão preservados. Quanto à eleição municipal de 2016, defendo que devemos construir uma aliança bastante sólida com partidos que compõem a base de sustentação do governo da presidenta Dilma, especialmente com o PCdoB. Acho que devemos conversar muito também com o PTB que governou conosco o Estado. E tenho muita convicção em defender, no diálogo interno do PT, que a melhor candidatura para nos representar neste momento da eleição municipal é a da Manuela. Acho que ela é a candidatura da vez, tem as qualidades necessárias para essa disputa e cresceu muito como quadro político. Penso que o PT deve trabalhar para indicar um vice e dialogar com o PTB para conseguir apoio a essa indicação. Fico honrado pela lembrança do meu partido, acho que os três nomes postos têm qualidades, mas entendo também que o momento não é para a gente mergulhar neste assunto.