Dilma: “Privatização da Eletrobras é assalto completo ao povo brasileiro”

Foto: Roberto Stuckert Filho

Petista alerta que entreguismo integra plano de desindustrialização de Bolsonaro: “Esse país precisa de uma malha de indústrias para mudar de patamar e não cair na armadilha de virar uma grande fazenda”.

A privatização da Eletrobras não é apenas mais uma entrega do patrimônio brasileiro ao capital estrangeiro e um ataque à dignidade da população, espelhado nos abusivos aumentos do preço da energia. Trata-se de uma ampla estratégia de destruição total do Estado pelo governo Bolsonaro. O caminho? A transformação do país em uma grande fazenda por meio de um processo de desindustrialização, feita a toque de caixa. Desferido mais um golpe contra a soberania nacional, consolida-se a posição do Brasil na vanguarda mundial do atraso econômico, alerta a ex-presidenta Dilma Rousseff.

“A Eletrobras funciona na medida em que já tem muita usina já amortizada, com investimento já pago pelos brasileiros, e isso está prorrogado até 2042. [Com a privatização], a conta de luz vai quadruplicar, quintuplicar, é um absurdo”, denunciou Dilma, em entrevista ao Brasil 247, no sábado (5).

“E é um absurdo porque esse país precisa ser reindustrializado, precisa de um processo de criação de uma malha de indústria, não só de grandes, mas de pequenas e médias indústrias que façam com que um país possa mudar de patamar e não caia na armadilha de virar uma grande fazenda” alertou Dilma.

“Nós estamos experimentando um processo acelerado de desindustrialização”, avisa a petista. “Como você vai reindustrializar [o país] sem ter energia, em quantidade significativa, e a preços módicos?”, questionou Dilma. “Vender a Eletrobras por R$ 20 bilhões é um acinte”, criticou a ex-presidenta, para quem o parque hidrelétrico da empresa vale, “no mínimo”, R$ 400 bilhões. Ela fala com conhecimento de causa. Graças às medidas adotadas durante o seu governo, o fornecimento de energia barata foi garantido à população.

Exemplo da China

Dilma voltou a reforçar a dimensão e o papel crucial da indústria no desenvolvimento econômico de um país, mencionando o extraordinário exemplo chinês. “Os EUA são o país mais rico do mundo e perdem para a China, que tem hoje um parque industrial que é a indústria do mundo”, definiu.

“No processo de transformar os bancos e as instituições financeiras nas instituições dominantes da economia americana, [os EUA] perderam o bonde da história”, sentenciou. Dilma citou o pacote de trilhões de dólares de injeção na economia americana de Joe Biden, dos quais 30% são abocanhados pela China.

TCU

Dilma também avaliou a atual etapa do processo de privatização da empresa, que está sob análise do Tribunal de Contas da União (TCU) por irregularidades e suspeita de fraude, conforme vem denunciando o Partido dos Trabalhadores e especialistas do setor elétrico. Ela também apontou o papel do Ministério de Minas e Energia de Bolsonaro no golpe contra o povo brasileiro. Análise do TCU aponta para uma subavaliação do valor da outorga da empresa, de R$ 23,2 bilhões.

Para Dilma, com todos os problemas no processo, e a menos de um ano das eleições, “deveria ser proibido esse tipo de transferência de ativos. O que deixa de herança maldita… É um absurdo”.

Além disso, segundo Dilma, “nenhum país do mundo que tenha a dominância que a energia hidroelétrica tem, como na matriz brasileira, privatizou suas empresas”. Ela citou o caso dos EUA, que mesmo com um percentual baixo na matriz, nunca permitiu a privatização da energia hidrelétrica. “Ela diz respeito, também, ao controle da água, da regularização dos rios, de uma riqueza que é fundamental para um povo, uma nação”.

Argumentos para privatização são outra fake news de Bolsonaro

Dilma desmontou o falso argumento de que a Eletrobras precisa ser privatizada para poder atrair investimentos e suprir uma suposta falta de caixa. “O motivo pelo qual o governo está privatizando é uma grande fake news”, ressaltou, explicando que “em energia elétrica, o financiamento é feito pelo chamado “projeto de financiamento com base em recebíveis”. Ou seja, o retorno do investimento é totalmente garantido pela própria atividade da empresa.

“É isso o que sempre financiou os grandes projetos do Brasil, inclusive aqueles com predominância privada, como Jirau, Santo Antônio e Belo Monte”, frisou. Entre 2003 e 2018, 80% dos investimentos no setor elétrico foram privados, com parceria pública minoritária, reforçou a presidenta. “Na média, os grandes investimentos foram 60% privado, 40% público”.

Países buscam energia barata

Para Dilma, a energia impacta diretamente na renda, “por isso os países buscam energia barata”. Além disso, a petista lembrou que, pelo modelo dos contratos de concessão e exploração da energia hidrelétrica, por um período de 30 anos, quem paga o investimento das usinas é o povo brasileiro. Daí a decisão de seu governo de transferir, após a amortização prevista ao fim do contrato, o valor investido à população, resultando em uma queda na tarifa de energia. Medida que lhe rendeu uma acusação mentirosa de que ela teria “desorganizado” o setor elétrico. “Isso estava previsto no contrato”, rebateu Dilma.

Pelo modelo previsto na privatização, a tarifa de energia pode subir sem aviso prévio, explicou. “Para a Eletrobrás valer alguma coisa, essa energia já paga tem de ser passada para o [setor] privado, e ele pode cobrar qualquer tarifa. Ou seja, ele não teria mais de dar à população brasileira a parte que ela já pagou”, explicou Dilma. “É um roubo”, disse, lembrando que a Eletrobras é a maior empresa de energia da América Latina. “A Eletrobras tem 48 usinas hidrelétricas, além da maior parte das usinas eólicas”, apontou.

Tarifa vai aumentar mais, alerta Dilma

“Falam muito no custo Brasil. Aumentar a tarifa de energia para beneficiar comercializadores de energia, que é o que estão fazendo, é um absurdo contra a indústria brasileira, contra o pequeno comerciante”, disse Dilma. A ex-presidenta, que também foi ministra de Minas e Energia no primeiro governo Lula, alerta que as tarifas de energia poderão subir ainda mais. Ela citou medidas de contratação de energia térmica a gás, que é mais cara, e só é utilizada quando não há hidrelétricas.

“Isso vai elevar a tarifa em proporções três a quatro vezes mais do que o necessário. Só se usa térmica a gás quando falta água. Quando não falta, não se pode usar, porque encarece a energia. Estão fazendo isso por lobby empresarial e político”, denunciou. “Essas usinas estarão longe de centros consumidores e gasodutos. Terão de fazer linhas de transmissão e gasodutos, o que vai tornar a energia mais cara”.

Dilma ainda acusou o governo Bolsonaro de ser refém do lobby do carvão de Santa Catarina. “O carvão é responsável por 3,1% do total das fontes de energia usadas na matriz energética brasileira”. O carvão, além de ser a mais cara fonte de energia, é a mais poluente, demonstrou Dilma. “É um escândalo privilegiar um grupo individual em Santa Catarina”, concluiu.

Redação da Agência PT

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