Newton Lima e Ricardo Berzoini (*)
No próximo dia 5 de outubro, a Constituição brasileira comemorará 25 anos e no próximo ano realizaremos nossa sétima eleição presidencial depois do regime de exceção que interrompeu o governo de João Goulart e jogou o Brasil nas trevas do arbítrio. É o mais longo período de democracia da nossa República. O texto constitucional contém as bases de uma Nação moderna, com uma concepção de proteção social e uma visão de um Estado forte, sem ser dirigista, nem estatizante. Prevê uma sociedade democrática, participativa e vigilante, combinando a democracia representativa com alguns elementos de mecanismos participativos.
Depois desses 25 anos, podemos dizer que grande parte dos direitos inscritos na Carta Magna ainda está por se tornar realidade para a maioria do povo brasileiro. E há uma sensação de impasse político na busca por esses direitos, em que pesem os avanços extraordinários alcançados nos dez anos de gestão democrática e popular, pelos governos liderados pelo PT.
As manifestações de junho passado, descontados os segmentos antidemocráticos e oportunistas que tentaram disputar e manipular aquela energia popular, refletem em grande parte essa sensação, especialmente nos direitos sociais básicos à saúde, educação e mobilidade urbana digna.
Esse impasse político decorre, essencialmente, dos limites de nossa democracia representativa. A estrutura política brasileira permanece como obstáculo à consecução dos objetivos maiores de nossa Constituição. Nossa vida pública vem sendo desgastada por esses limites, entre os quais destacamos a predominância do poder econômico nos processos eleitorais e a baixa densidade programática dos partidos brasileiros, com raras e honrosas exceções.
Atenta a essa realidade, a presidenta Dilma sugeriu, em carta ao Congresso Nacional, a realização de um plebiscito para consultar a opinião do povo brasileiro sobre uma reforma política. A Câmara dos Deputados, na pessoa de seu presidente, reagiu contrariamente, criando um Grupo de Trabalho sobre o tema. O plebiscito só se manteve no horizonte graças à iniciativa da bancada do PT, que depois de muitos esforços, teve acordo com PCdoB, PDT e PSB para buscar apoios a uma proposta a ser levada ao plenário da casa. Essa coleta de apoios está em curso e deve ser um dos vetores centrais de nossa política.
Ao mesmo tempo, o grupo de trabalho, coordenado pelo dep. Vaccarezza, indicado pelo presidente Henrique Alves, segue seus trabalhos. Realizou uma reunião inicial e duas audiências públicas, com entidades que têm propostas sobre o tema, além de abrir um espaço específico no e-democracia, do site da Câmara, para participação dos internautas.
No andar lento desta carruagem, sobressai a presunção de parte do GT de que qualquer mudança só será possível para eleições posteriores a 2014. O PT tem insistido que o sentimento popular, confirmado por pesquisas de opinião, é de que mudanças importantes possam alterar a política já para 2014.
Nesse cenário, a bancada do PT deve insistir na urgência por mudanças e dar preferência ao tema do financiamento público de campanha, com limitação austera de gastos, como forma de dialogar com o sentimento de que não pode haver impacto orçamentário relevante. Limitações à contratação de “cabos eleitorais” e maior transparência nas informações sobre as receitas e despesas eleitorais são medidas acessórias importantes. E, dialogando com a proposta do MCCE, que aglutina CNBB, OAB, CUT, CONTAG, CNTE e UNE, entre outras, aceitar a participação de pessoas físicas no financiamento, limitadas a R$ 700.
O PT pode e deve trabalhar por uma reforma que já produza efeitos saneadores na eleição de 2014. Pode e deve destacar que a presença de empresas, na sua maioria grandes corporações, no financiamento de campanha, estabelece um ambiente de contaminação e suspeição, que objetiva e subjetivamente, contribui para a redução da representatividade da política brasileira, nas eleições majoritárias e proporcionais.
Nesse sentido, para evitar confusão na sociedade e inclusive nas nossas bases, não faz sentido votar uma chamada “minirreforma eleitoral”, sem que se estabeleça um processo de luta política para explicitar que é possível afastar o financiamento privado com a simples aprovação de mudanças na lei ordinária. Registre-se que o texto relatado pelo dep. Vaccarezza tem várias mudançapositivas em aspectos operacionais dos partidos e das eleições. Mas é preciso dizer que nenhuma delas dialoga com as questões estruturais de uma reforma política que permita mudar o quadro das disputas eleitorais e aproximar a perspectiva política do país das diretrizes dos artigos 1º a 11º da Constituição.
A bancada do PT deve reafirmar seus compromissos com as diretrizes da reforma política emanadas pelos delegados do 3º Congresso do Partido. E entende que a tática política mais adequada a este momento da política brasileira é defender a realização de um plebiscito, e que a Câmara deve votar uma medida efetiva para ampliar nossa democracia e minimizar o peso do poder econômico: o fim do financiamento empresarial das eleições, já em 2014.
(*) Newton Lima (PT-SP) e Ricardo Berzoini (PT-SP) são deputados federais.