Até o vetusto Financial Times manifestou desconfiança em relação aos dados econômicos produzidos e divulgados pelo governo Bolsonaro. Em matéria de Jonathan Wheatley, o jornal afirma que “as recentes revisões e a possibilidade de mais por vir levantaram dúvidas pela primeira vez sobre os dados brasileiros”. Segundo o FT, isso compromete o histórico do país, cujos dados há muito (tempo) eram vistos como um exemplo de pontualidade e transparência entre os países emergentes”.
O Ministério da Economia do Brasil revisou seus números de exportação pela segunda vez em menos de uma semana, colocando dúvidas sobre os principais lançamentos de dados e deixando os analistas se perguntando se ainda devem acreditar na confiabilidade das estatísticas brasileiras.
As dúvidas surgiram na semana passada, quando a moeda do país foi atingida por números do Banco Central, mostrando uma acentuada deterioração do saldo da conta corrente do Brasil no período de janeiro a outubro, impulsionada por uma queda nas exportações.
Mas a moeda se recuperou na quinta-feira, quando o Ministério da Economia revelou que as exportações nas quatro primeiras semanas de novembro não foram, como afirmado anteriormente, calculadas nos decepcionantes US$ 9,7 bilhões, mas atingiram US$ 13,5 bilhões – números muito melhores.
A controvérsia continuou nesta semana. Na noite de segunda-feira, o Ministério da Economia disse que seu erro foi causado por uma falha em registrar um grande número de declarações de exportadores nos últimos três meses, e que as exportações em setembro e outubro também foram subnotificadas em US$ 1,37 bilhão e US$ 1,35 bilhão respectivamente.
Na terça-feira, seguimos dados melhores do que o esperado para o PIB do 3º trimestre – compilados antes da disponibilização dos números revisados das negociações de segunda-feira.
“Os números do PIB mostraram uma contração bastante significativa nas exportações no terceiro trimestre, então talvez isso também seja revisto”, disse Gustavo Rangel, economista-chefe da América Latina no ING Financial Markets em Nova York.
Ele disse que os dados do PIB, embora melhores do que o esperado, levantaram dúvidas entre alguns analistas por causa de um número grande fora do comum de estoques de empresas, um indicador negativo para a atividade econômica. Era possível, ele disse, que parte do estoque tivesse sido exportado, mas ainda não era possível saber.
As recentes revisões e a possibilidade de mais por vir levantaram dúvidas pela primeira vez sobre os dados brasileiros, há muito vistos como um exemplo de pontualidade e transparência entre os países emergentes.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) disse que pode ter que revisar os dados do 3º trimestre, mas normalmente faria isso em apenas um ano. No entanto, dada a magnitude do erro do Ministério da Economia, era possível que um número revisado fosse divulgado juntamente com os números do quarto trimestre, programados para o início de março.
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O Ministério da Economia disse estar satisfeito com o fato de os dados revisados sobre as exportações refletirem a verdadeira posição e enfatizou que operava uma política de total transparência e boas práticas.
O IBGE disse que o PIB subiu 0,6 por cento no terceiro trimestre em comparação com o segundo e 1,2 por cento em comparação com o terceiro trimestre do ano passado, superando confortavelmente as expectativas dos analistas. No entanto, afirmou que as exportações de bens e serviços caíram acentuadamente em 2,8% em relação ao segundo trimestre.
O câmbio avançou de R$ 4,22 por um dólar na terça-feira para R$ 4,19 após a divulgação dos dados, antes de abrir mão de alguns ganhos nas negociações posteriores.
Os movimentos da semana passada foram ainda mais nítidos. O real começou a semana em cerca de R$ 4,20 por dólar e caiu para a posição recorde de quase R$ 4,28 na terça-feira, antes de se recuperar para R$ 4,18 na sexta-feira.
“O real caiu devido à forte erosão da balança comercial e da conta corrente, o que significaria que os fundamentos da moeda estavam mais fracos”, disse Alberto Ramos, analista do Goldman Sachs em Nova York. “As pessoas certamente ganharam ou perderam dinheiro” como resultado da confusão sobre o verdadeiro estado das exportações, acrescentou.
Ele disse que não há suspeita de que os dados tenham sido manipulados, mas que o incidente levantou várias preocupações.
“Este é um grande erro”, disse ele. “Acho que não há jogo sujo, apenas incompetência ou negligência no momento em que os mercados estão ficando preocupados com a erosão do comércio”.
Rangel, do ING, disse que a verdadeira explicação é mais provável que o Ministério da Economia do Brasil – um “superministério” criado este ano ao fundir o ministério das finanças com outras partes da administração econômica do governo – tenha sido vítima de suas próprias medidas de corte de custos. “Eles não podem contratar e muitas pessoas estão se aposentando, por isso estão esticadas”, disse ele.
“Como o setor público funciona quando as contas fiscais são tão apertadas? Existe até o risco de uma paralisação do governo no próximo ano, se eles não puderem cortar outros gastos”.
Jonathan Wheatley | FT
Leia matéria na íntegra:
https://www.ft.com/content/bc552d72-15cf-11ea-9ee4-11f260415385
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