A luta pela superação das desigualdades no Brasil não é algo que possa ser realizado num curto espaço de tempo. São séculos de marginalização, de esmagamento dos direitos do nosso povo, e de afirmação de uma ideologia que justifica os privilégios em nome sabe-se lá do quê. Melhor, sabe-se sim, porque os que detêm privilégios sempre acreditaram, e acreditam, que isso é uma espécie direito natural, e por isso é possível ler, aqui e acolá, inclusive em páginas de jornal, o lamento ou a revolta diante da ascensão dos pobres no Brasil, a invadir espaços antes restritos às elites, que ousadia.
É uma ideologia branca, nascida dos tempos da escravidão. É a ideologia da casa-grande. Os pobres, os negros, os miseráveis deveriam saber que o lugar deles é na senzala, lá nos barracos da cidade. Não podem e não devem ocupar espaços reservados aos brancos. O Brasil, no entanto, nessa década, está mudando, e os senhores e senhoras da casa-grande e seus ideólogos, mostram-se incomodados, são acometidos de urticária, vêem-se à beira de um ataque de nervos com essa invasão imprópria dos pobres. É neguinho querendo comprar, e comprando, viajar de avião, andar nos shoppings, alguns até ousando fazer turismo no exterior.
Disse e reafirmo: é dura a luta para chegar a um País menos desigual, que ofereça oportunidades, possibilidades para todos, que garanta renda às maiorias despossuídas, que ofereça condições dignas de vida aos brasileiros e brasileiras. Mas, sem dúvida, estamos caminhando, e celeremente, para o enfrentamento do problema graças, sobretudo, à política. A eleição de Lula em 2002 marcou uma virada, significou uma atenção especial do governo em relação aos mais pobres, sobretudo e especialmente no sentido de que o desenvolvimento, na nova ótica instalada, só pode ser compreendido assim se representar melhoria nas condições de vida da população. Esta compreensão é parte dos dois mandatos de Lula e do governo atual, de Dilma.
Nesse caso, para que não nos acusem de nos basear apenas nos dados do governo, e não haveria nada demais se fossem utilizados, recorro a partes do relatório da consultoria Boston Consulting Group, divulgado na semana que passou. O estudo compara meia centena de indicadores econômicos e sociais de 150 países, coletados junto ao Banco Mundial, FMI, ONU e OCDE. E dele salta uma conclusão que deve assustar ainda mais os nossos casa-grandenses: o Brasil foi a nação que melhor utilizou o crescimento econômico dos últimos cinco anos para elevar o padrão de vida e o bem-estar do seu povo. Insisto: é isso mesmo. E o faço para combater o que Nelson Rodrigues denominava “complexo de vira-latas”, que caracterizaria nossa permanente subestimação de nossa capacidade como nação, neste caso a capacidade da política de mudar o País.
O PIB brasileiro cresceu a um ritmo médio anual de 5,1% entre 2006 e 2011, o que não é pouco, mas poderia significar nada para os mais pobres, como em tantas outras situações de nossa história. Pela força das políticas da última década, os ganhos sociais obtidos no período, segundo o relatório, se equiparam a um país que tivesse crescido a coisa de 13% ao ano. Dito de outra forma, para efeito de redução da pobreza é como se o Brasil tivesse crescido bem mais do que a China nos últimos cinco anos.
As melhorias na qualidade de vida da população, de acordo com a consultoria, decorrem especialmente da prioridade dada à distribuição de renda no período, prioridade governamental, evidentemente. É o milagre da política, tão atacada, tão vilipendiada, e tão capaz de produzir mudanças como as que estamos assistindo nesta última década.
Ressalto novamente, apesar da aparente obviedade, que a luta para superar as desigualdades é longa. Acentuo, no entanto, que esta última década significou um extraordinário passo adiante, ao mudar para melhor a vida de mais de 70 milhões de pessoas. Seguramente é isso que tem incomodado tanto parte de nossa elite, que não se conforma com a ousadia de tantos pobres ascendendo à condição de cidadãos. Tudo isso ocorreu graças à política, aos governos que o povo brasileiro escolheu desde 2002.
*Texto publicado originalmente na edição desta segunda-feira, 03, no jornal A Tarde. Emiliano José é jornalista, escritor e suplente de deputado federal pelo PT/BA.