50% das cidades têm mais inscritos no Auxílio Brasil do que trabalhadores

Foto: Giorgia Prates/Brasil de Fato

A destruição prometida – e entregue – por Jair Bolsonaro fez do Brasil um país onde o número de beneficiários do Auxílio Brasil já supera o de empregados com carteira assinada em metade (50,3%) dos municípios. A precarização das relações trabalhistas propiciada pela “reforma” de Michel Temer se agrava em três anos e meio de Bolsonaro e em 2022 chega ao ápice, com desemprego, inflação e juros na casa dos dois dígitos.

“Cenário é tão caótico que o número de famílias do Auxílio Brasil é maior que o de empregados com carteira em metade das cidades do país. E o programa ainda deixou de fora 8 milhões que vivem na pobreza. É retrato da falta de oportunidade e do governo do descaso com quem precisa”, comentou a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), em postagem no Twitter.

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O número foi obtido a partir de levantamento realizado pelo jornal Folha de São Paulo com dados de junho do Ministério da Cidadania e da Secretaria Especial do Trabalho. De 5.426 cidades analisadas, 2.728 se encontram nessa situação. Na origem do fenômeno estão a queda na renda média do trabalhador e a falta de oportunidades de emprego.

Apenas 65 grandes municípios do país concentram metade dos empregos formais, enquanto abrigam, juntos, um terço da população nacional. Isso faz com que, entre as 326 cidades com 100 mil habitantes ou mais, apenas 48 possuam menos celetistas que famílias beneficiadas (14,7%).

É o caso de Nova Iguaçu e Belford Roxo, ambos na Baixada Fluminense (RJ). A primeira, com 825 mil habitantes, fechou o primeiro semestre com 83,2 mil trabalhadores empregados formalmente e 114,4 mil famílias beneficiadas pelo Auxílio Brasil. Na segunda, com 515 mil habitantes, a proporção era de três famílias atendidas pelo programa (67,6 mil) para cada habitante formalmente ocupado (21,2 mil).

No recorte regional, 94% dos municípios do Nordeste possuem mais beneficiários do que empregados. No Norte, são 82,3%. Nas demais regiões os percentuais são inferiores: 12,9% no Sul, 28,7% no Centro-Oeste e 30,9% no Sudeste.

No agregado por estado, o total de benefícios supera o de empregos com carteira assinada em 12 unidades, todas do Norte (Acre, Amazonas, Amapá e Pará) e Nordeste (Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí e Sergipe). Amazonas, Piauí, Pernambuco, Sergipe e Bahia tiveram mais famílias cadastradas no programa do que postos de trabalho criados. Em Alagoas, houve retração no número de empregos.

A situação também é mais comum nas cidades com menor Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM). O número de empregados é menor que o de famílias beneficiadas em 99,7% das cidades com o índice considerado baixo (inferior a 0,55 na escala de 0 a 1). Nas cidades com o índice considerado muito alto (acima de 0,8), não há nenhuma com menos trabalhadores com carteira que famílias beneficiadas.

Estrutura econômica dos municípios influencia resultados

“Esses números não surpreendem, pois estão diretamente associados à estrutura econômica dos municípios brasileiros”, avalia Débora Freire, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Para Débora, apenas o Auxílio Brasil é insuficiente para alterar o cenário. “Essas políticas têm a capacidade de fomentar principalmente o comércio e serviços. Mas, até que isso se traduza em maior formalidade e se reflita no mercado de trabalho, não é algo rápido.”

Ainda conforme o balanço da Folha, em junho o Auxílio Brasil tinha um tíquete médio de R$ 405,48, considerando benefícios extraordinários acumulados. Em agosto, as famílias passam a receber parcela mínima de R$ 600. Mas o acréscimo temporário já chega defasado pela inflação galopante do ministro-banqueiro Paulo Guedes.

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Economista e professor do Insper, Sergio Firpo ressalta que as pequenas cidades vivem à margem do crescimento econômico, por isso a dificuldade de gerar emprego. “Os municípios mais pobres são aqueles em que há muita gente fora da força de trabalho, ou na informalidade, e pouca gente no setor formal”, aponta. “Não é surpreendente que o número de beneficiários seja maior do que o de trabalhadores formais.”

Mas o fenômeno não é exclusivo da zona rural, lembra o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Ibre) Daniel Duque. “Apesar de a informalidade ser um problema maior em regiões rurais e menos densas, nas grandes cidades das regiões metropolitanas há uma carência muito grande de emprego de qualidade dentro da formalidade”, avalia o economista.

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Márcia Lopes: “Bolsonaro desmantelou o sistema de proteção social”

Em entrevista ao Jornal PT Brasil nesta segunda-feira (8), Márcia Lopes, ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome no último ano do Governo Lula, critica a ineficiência do Auxílio Brasil. “Bolsonaro fez questão de individualizar o benefício, desde o auxílio emergencial, não se comunicando com os municípios, e aí as filas aumentaram cada vez mais”, afirma, lembrando que as equipes sequer tiveram acesso a informações de como os auxílios funcionariam.

Toda a integração que houve durante os governos petistas, que chegou a envolver 12 ministérios, avalia Márcia, foi desmantelada pelo desgoverno Bolsonaro. Ao “transformar a renda num voucher”, diz a ex-ministra, Bolsonaro jogou por terra todo o arcabouço de políticas públicas de segurança alimentar e inclusão produtiva construído ao longo dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

Márcia diz ainda que “não há política pública com critérios claros e instabilidade para as famílias”. O “abandono da população mais pobre”, lamenta, chega ao paroxismo com a proposta bolsonarista de concessão de crédito consignado, com juros leoninos, a beneficiários de política de distribuição de renda.

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“Isso é o uso abusivo de mais uma decisão que na realidade desprotege, em vez de proteger”, ataca a ex-ministra. “O marketing é esse, de acesso a serviços bancários, mas sabemos muito bem que agora o Auxílio Brasil é para os bancos”, finaliza.

PTNacional

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