Os deputados Jorge Solla (PT-BA) e Leo de Brito (PT-AC) questionaram o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, general Luiz Eduardo Ramos, sobre as ameaças do presidente Bolsonaro à democracia, o negacionismo de integrantes do governo em relação à pandemia, além dos casos de corrupção envolvendo a negociação de vacinas no Ministério da Saúde. As indagações aconteceram durante audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, realizada nesta quarta-feira (18).
O deputado Jorge Solla lembrou o ministro sobre as recentes declarações antidemocráticas do presidente Bolsonaro relativas à comemoração da Independência no Brasil, no próximo dia 7 de setembro. Em áudio vazado à imprensa, Jair Bolsonaro incita seus aliados – através de mensagem pelo whatsapp – a comparecerem em peso às ruas e se prepararem para um possível “contragolpe”. Nesse caso, o presidente considera “um golpe” a não aprovação do voto impresso para as eleições do ano que vem.
“Senhor ministro, as eleições estão ameaçadas? Há o risco de o presidente da República não reconhecer o resultado das eleições? Que ameaça de contragolpe é essa do presidente Bolsonaro? As Forças Armadas precisam ter compromisso com a nossa soberania, e com a democracia”, cobrou Solla.
Segundo o parlamentar, as Forças Armadas precisam ser profissionais, respeitar as instituições, e proteger nossas fronteiras e o País de possíveis ataques externos, inclusive cibernéticos. “Não dá para as Forças Armadas compactuarem com aloprados que fazem ameaças golpistas, como as do atual presidente da República”, avisou.
Ao responder as indagações sobre ameaças à democracia, o ministro Luiz Eduardo Ramos minimizou as ameaças antidemocráticas feitas por Bolsonaro. Segundo ele, o presidente sempre garantiu que agiria dentro das “quatro linhas da Constituição”, esquecendo de mencionar as ameaças feitas por Bolsonaro e membros do governo sobre a não realização de eleições em 2022, caso o voto impresso fosse derrotado.
Durante a audiência, o ministro disse ainda que nunca existiu ditadura militar no Brasil. Segundo ele, o período de 21 anos em que militares se revezaram no comando do País, com denúncias comprovadas de perseguições, torturas e mortes, foi apenas “um regime forte de exceção”, que deve ser compreendido “dentro do contexto histórico da guerra fria”.
O deputado Leo de Brito disse ao ministro Ramos que lamentava que indagações sobre a possibilidade de não realização de eleições, ou sobre o não reconhecimento do resultado pelo presidente em caso de derrota, ainda precisassem ser feitas atualmente. Porém, ele apontou que essas dúvidas surgem por conta de declarações do próprio presidente da República e de integrantes do governo.
“Não podemos ter uma política de Ronaldinho Gaúcho, que olha para um lado e toca para o outro (ao se referir a uma jogada típica do ex-jogador de futebol). Sabemos que o presidente da República cria esse clima de crise permanente, porque acredita que isso o favorece”, explicou Leo de Brito.
Exposição dos militares ao ridículo
O deputado Jorge Solla disse ainda ao ministro que o presidente Bolsonaro tem exposto as Forças Armadas ao ridículo, como no caso do desfile na Esplanada dos tanques de guerra soltando fumaça, ou no exercício militar em Formosa (GO), realizado com a presença do presidente.
“O desfile virou chacota na internet, com a imprensa estrangeira afirmando que Bolsonaro estava transformando o Brasil em uma ‘República de Bananas’, assim como o exercício militar com a presença do Bolsonaro onde se explodiu a “casa da Barbie”, ao som (da música do filme) ‘Missão Impossível’. Isso não ajuda as Forças Armadas, ministro”, alertou o petista.
O parlamentar baiano ressaltou ainda que a presença maciça de militares no governo, cerca de seis mil, também tem desgastado a imagem das Forças Armadas. Segundo Solla, a presença de militares é maior em algumas áreas mesmo se comparado à época do regime militar. Como exemplo, o petista se referiu ao enorme número de militares no Ministério da Saúde, onde atualmente vários deles já comparecerem à CPI da Pandemia no Senado para esclarecer seus supostos envolvimentos na compra de vacinas superfaturadas.
Corrupção na compra de vacinas
Sobre a participação dos militares no governo, especialmente no Ministério da Saúde, o ministro Luiz Eduardo Ramos não explicou as acusações envolvendo a aquisição de vacinas. No entanto, ignorando os indícios e provas já colhidas pela CPI da Pandemia, Ramos disse que as acusações são “apenas narrativas”.
Ao responder questionamentos sobre o negacionismo do governo no combate a Covid, o ministro disse que é “injusta a pecha de genocida que tentam colar ao presidente e ao governo”. Segundo ele, isso se justificaria pelo fato de o Brasil já estar se aproximando do número de vacinas aplicadas pelos Estados Unidos.
A declaração de Luiz Eduardo Ramos entra em contradição com os sucessivos boicotes à compra de vacina, incentivados pelo próprio presidente Bolsonaro e patrocinados pelo governo, como no caso da Pfizer e Coronavac, que atrasaram o início da vacinação no Brasil.
Como exemplo do negacionismo em relação às medidas de prevenção à Covid, que é comum entre integrantes do primeiro escalão do governo, Luiz Eduardo Ramos – o único que não usava máscara na bancada da Comissão durante a audiência pública – chegou a dizer que a utilização da peça era “uma escolha pessoal”. Advertido de que esse ato é uma infração na maioria do Estados – inclusive em Brasília – e passível de multa, o ministro, constrangido, colocou a máscara no rosto.
Bolsonaro refém do Centrão
O deputado Leo de Brito também disse ao ministro que a retórica de confronto de Bolsonaro serve apenas para tentar esconder um governo fraco, cada vez mais refém do Centrão. “Cadê o ‘se gritar pega centrão…não fica um meu irmão’? (frase cantada pelo general Heleno na campanha para criticar o agrupamento político). O Bolsonaro nomeou um ministro indemissível, porque se ele demitir o (senador) Ciro Nogueira (da Casa Civil), o governo cai”, observou.
O parlamentar acriano indagou ainda ao ministro sobre os gastos públicos com as “motociatas” promovidas por Bolsonaro para tentar demonstrar força. Segundo o petista, na verdade esses atos são “campanha eleitoral antecipada”. Em resposta, o ministro afirmou que as “motociatas” são “eventos privados”, ignorando o alto custo de mobilização do staff presidencial para acompanhar Bolsonaro.
Héber Carvalho