A presidenta do Partido dos Trabalhadores, deputada Gleisi Hoffmann (PR), apresentou requerimento junto Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados convocando o ministro de Estado da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e o General Comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, “a fim de prestarem esclarecimentos sobre as pressões e intimidações impostas aos ministros do Supremo Tribunal Federal, em abril de 2018, através de publicações realizadas em redes sociais pelo general Eduardo Villas Boas, na véspera do julgamento, pela Corte Suprema, de um Habeas Corpus de interesse do Presidente Lula”.
A base do requerimento são fatos que “agora, se sabe, através de declarações do General (Villas Boas) publicadas em livro biográfico sobre ele, terem sido (as intimidações) um ato institucional do Exército brasileiro, discutido e decidido pelo Alto Comando da Instituição, realidade que caracteriza uma verdadeira insurreição e tipifica a prática de crime contra a segurança nacional”, argumenta Gleisi no requerimento apresentado às duas Comissões da Câmara dos Deputados.
Justificação
De acordo com o requerimento, “com efeito, no dia 03 de abril de 2018, quando toda a sociedade brasileira acompanhava atenta ao início do julgamento de um Habeas Corpus de interesse do Presidente Lula, que seria apreciado pelo Supremo Tribunal Federal, o General do Exército, Eduardo Villas Bôas, foi às redes sociais (twitter) e publicou uma série de ameaças veladas e intimidações dirigidas aos Ministros da Corte Suprema, que configuravam um verdadeiro recado para que o Tribunal não concedesse a ordem de Habeas Corpus”.
O requerimento cita afirmações do general Villas Bôas em seu livro, segundo publicações feitas pela imprensa nos últimos dias. Disse o General, entre outros vitupérios, numa primeira postagem: “Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais”. Afirmou, em seguida, “repudiar a impunidade e que o Exército está atento às suas missões institucionais”. Já numa segunda postagem, segundo as informações divulgadas, o general Villas Bôas asseverou: “Asseguro à Nação que o Exército brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e a democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais. ”
Trata-se, como se verifica, de uma ameaça grave à independência do Poder Judiciário e de seus integrantes, especialmente da Suprema Corte, bem como um ataque às instituições republicanas e à ordem democrática nacional, justifica o texto do requerimento. “Contudo, o que se pensava ser uma ação criminosa isolada do então General Villas Boas, apresenta-se agora, como uma deliberação institucional do Exército brasileiro, por seu alto comando, que se uniram no sentido de “mandar um recado” ao Supremo Tribunal Federal, acerca de eventuais consequências, para a Corte e a sociedade brasileira, de um eventual deferimento da ordem de Habeas Corpus do Presidente Lula”.
Essa confirmação veio à baila através do próprio General Villas Boas, em seu livro de memórias (Conversa com o Comandante), recentemente publicado pela Editora FGV, destaca a justificativa do requerimento. “No livro, o General afirma com letras garrafais, que o conteúdo das publicações foram exaustivamente discutidos com a alta cúpula do Exército, o que demonstra que as ameaças ao Supremo e à ordem institucional vigente, consubstanciaram uma posição claramente adotada pela Instituição “Exército Brasileiro” e não uma ação isolada de um militar saudosista dos tempos da ditadura militar, em que Juízes poderiam ser destituídos e suas decisões previamente aquilatadas pelos Militares, além de outros tantos prejuízos impostos ao País e a sociedade brasileira”.
“As afirmações do General Villas Boas, tanto as pretéritas, quanto as atuais (publicadas no Livro), são gravíssimas e apenas confirmam o que já se interpretara à época dos fatos, no sentido de que as forças armadas, por seu Exército brasileiro, não aceitariam outra decisão, senão a negativa, pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, da rejeição do Habeas Corpus de interesse do Presidente Lula”, afirma Gleisi. “São condutas que atentam contra a ordem institucional e democrática, na medida em que objetivaram subjugar a independência e a liberdade de funcionamento de um Poder da República e de seus integrantes.
“A iniciativa do General em 2018 e agora a confirmação de que se tratava de uma posição Instituição do Exército, por seu alto comando, representa uma postura ultrajante, desrespeitosa, ofensiva e criminosa, ressalta a justificativa do requerimento”. De acordo com o requerimento, Viola flagrantemente o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, chocando-se, ademais, com o objetivo fundamental da Nação, consistente nos seguintes pontos insculpidos na Carta Federal (art. 3º, incisos I e IV da CF).
O requerimento destaca os artigos:
“Art. 3º (…)
I – Construir uma sociedade livre, justa e solidária;
IV – Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Viola ainda, o fundamento do pluralismo político (art. 1º, inciso V da CF), que se constitui numa verdadeira salvaguarda do pensamento divergente, das ideias livres, da possibilidade da discordância democrática, do respeito às diferenças, da afirmação de direitos de forma indistinta, sem que se possa identificar, nessas posições ou ações, individuais ou coletivas, ameaças ao Estado brasileiro e as suas instituições, a ponto de se aventar, uma intervenção militar, supostamente no cumprimento de suas missões constitucionais.
Ademais, a conduta do General e de seus pares (alto comando militar do Exército, constitui crime contra a segurança nacional. Com efeito, a Lei de Segurança Nacional (7.170/1983) estatui o seguinte:
Art. 18 – Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados.
Pena: reclusão, de 2 a 6 anos.
Art. 22 – (É considerado crime) fazer, em público (redes sociais), propaganda:
I – de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social;
IV – de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
Pena: detenção, de 1 a 4 anos.
- 1º – A pena é aumentada de um terço quando a propaganda for feita em local de trabalho ou por meio de rádio ou televisão.
- 2º – Sujeita-se a mesma pena quem distribui ou redistribui. (g.n).
Art. 23 – Incitar:
I – à subversão da ordem política ou social;
II – à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis:
III – à luta com violência entre as classes sociais;
IV – à prática de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.
No mesmo sentido, o artigo 286 do Código Penal estatui:
Incitação ao crime
Art. 286 – Incitar, publicamente, a prática de crime:
Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa.
“Nessa perspectiva, além de buscar junto ao Ministério Público Federal a abertura de uma investigação aprofundada em relação a todos os responsáveis por essas condutas reprováveis e criminosas, entendemos que o Poder Legislativo não pode ficar inerte diante da gravidade do que se relata nesse requerimento de convocação, de modo que a presente iniciativa visa substancialmente suscitar das autoridades convocadas esclarecimentos acerca desses graves fatos, agora apresentados à sociedade brasileira com outra roupagem, muito mais grave e perigosa”, reafirma o requerimento.
Da Agência PT de Notícias