Governos do golpe transformam gás de cozinha em produto de luxo

Entre os tantos danos à população desde o golpe contra a presidenta legitimamente eleita Dilma Rousseff, em 2016, o aumento do preço dos derivados de petróleo é dos mais emblemáticos. Crescem os relatos de que famílias mais pobres abandonaram o fogão pela lenha, e o preço do óleo diesel está na origem do movimento deflagrado esta semana pelos caminhoneiros, apoiado pelos petroleiros e pelos revendedores de gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha.

Nesta segunda (1º), dia em que as entidades representativas dos caminhoneiros convocaram uma paralisação nacional, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) e seus sindicatos realizaram pelo país atos de apoio ao movimento e contra a política de reajuste imposta pela direção da Petrobras.

A categoria subsidiou a distribuição de 1.180 botijões de gás, que foram doados ou vendidos pela metade do preço praticada pelas distribuidoras. As mobilizações ocorreram em regiões da periferia de Pernambuco, Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba e Esteio (RS).

Desde 2016, como parte do processo de desmonte do Sistema Petrobras, as gestões neoliberais da empresa praticam o Preço de Paridade de Importação (PPI). Com isso, o valor dos derivados varia conforme a variação do valor do barril de petróleo no mercado internacional e as oscilações do dólar e dos custos de importação, fazendo com que os reajustes sejam frequentes e abusivos.

“Por conta da política de preços da Petrobras, estamos sofrendo com aumentos descontrolados dos derivados de petróleo, o que inviabiliza setores estratégicos da economia, além de afetar massivamente a população”, critica o coordenador da FUP, Deyvid Bacelar.

“A venda de ativos no Brasil e o foco na geração de lucro para acionistas está ampliando a dependência da Petrobras do mercado internacional. O resultado disso é a aceleração dos reajustes de preços dos combustíveis no país, afetando diretamente as classes mais baixas, pelo efeito cascata gerado sobre a inflação de alimentos e outros gêneros de primeira necessidade”, alerta o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Cloviomar Cararine.

Alta do botijão afeta as famílias mais pobres

Estudo do Dieese revela que entre julho de 2017 e janeiro de 2021, o preço do barril do petróleo acumulou reajustes de 15,40%, mas a direção da Petrobras aumentou em 59,67% o preço da gasolina e em 42,64% o do diesel nas refinarias. Já o GLP subiu 130,79%, oito vezes mais que a inflação medida pelo INPC no mesmo período de 15,02%.

Ao longo de 2020, o preço do gás de cozinha subiu 8,3%, segundo o Índice Geral de Preços ao Consumidor (IPCA-15) do IBGE. O salto foi duas vezes maior que a inflação projetada para o ano, de 4,23%. Mas o preço do GLP nem sempre esteve nesse patamar.

Entre 2007 e 2014, durante os governos do PT, os valores se estabilizaram, voltando a sofrer acréscimos mensais em 2017, com o usurpador Michel Temer. Em 2019, sob Bolsonaro, as alterações passaram a seguir o fluxo do mercado internacional do petróleo. Com isso, o preço do gás de cozinha passou a também ser dolarizado.

Membro da carreira de especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do governo federal, Paulo Kliass explica que as constantes altas registradas no país são um reflexo da vinculação do preço do gás à conjuntura global. “Mas se houvesse vontade política de romper com isso, a gente não teria essa alta tão expressiva”, ressalta.

Alexandre Borjaili, presidente da Associação Brasileira dos Revendedores de Gás Liquefeito do Petróleo (Asmirg), que representa mais de cinco mil revendedoras, argumenta que essa é uma forma ilegal de atuar, uma vez que o GLP é produzido e comercializado no Brasil.

“A Petrobras, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, não poderia praticar preços internacionais”, aponta Borjaili. “Se persistirem esses aumentos consecutivos, sem limites, a previsão é de que o gás de cozinha chegue logo a R$ 150. Vai ser um pulo. Já para chegar a R$ 200 depende dessa política de preços.”

“Nós vendemos em média 35 milhões de botijões de gás todo mês. O país tem 15 milhões das famílias no Bolsa Família que vivem com uma renda per capita de até R$ 87. Então, nem gás podem comprar. Logo, esse aumento prejudica sobretudo a população mais vulnerável”, diz Borjaili. “Não é a classe A que precisa do gás de cozinha. Quem precisa é quem tem que fazer arroz, feijão, mingau todos os dias. É um desrespeito.”

Segundo ele, quando o PT saiu da Presidência houve um aumento extorsivo por parte da estatal, que piorou com a política de Bolsonaro e Guedes. “A Petrobras não pode falar em prejuízo com o preço do GLP. Eles cobram o gás a R$ 36,00 nas refinarias. Se eles mantivessem a política de Dilma, o preço estaria a R$ 28,00 para o consumidor. É um roubo o que está acontecendo. O gás virou produto de luxo e não de utilidade púbica. Podemos fechar por falta de margem de lucro”, pontuou.

Borjaili lembrou promessas de ministros de Minas e Energia e da Economia de que o preço do gás iria cair até 40% ou 50% com a adoção de medidas neoliberais no sistema. “Mas desde então o valor só sobe – e não há qualquer previsão de redução”, ressalta. “Pelo contrário, o que temos é aumentos consecutivos. A Petrobras não passa um mês sem aumentar ao menos 5% do combustível [vendido às refinarias] e, alinhado a isso, tem o aumento dos estados via ICMS.”

Uma das promessas citadas pelo empresário foi feita em abril de 2019 pelo ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, que prometeu “quebrar” o monopólio da Petrobras sobre o refino do petróleo e a distribuição. “Daqui a dois anos, o botijão vai chegar pela metade do preço na casa do brasileiro. Vamos quebrar os monopólios e baixar o preço do gás e do petróleo”, garantiu o ilusionista Guedes.

Para Borjaili, no entanto, ocorreu o contrário. “Piorou ainda mais com a venda da participação da Petrobras na Liquigás Distribuidora. Diziam que isso iria abrir o mercado, mas nenhuma empresa nova foi aberta, os mesmos continuam operando, num oligopólio. A venda da Liquigás foi um câncer para a população”, atacou.

Após privatização, dívida da BR Distribuidora cresceu 96%

A Liquigás foi vendida para um consórcio formado pela Copagaz, Itaúsa e Nacional Gás por R$ 4 bilhões, em dezembro do ano passado, como parte do processo de desmantelamento do Sistema Petrobras. Uma das justificativas para o desmonte é a necessidade de realizar privatizações para diminuir dívidas. Esse foi o argumento, por exemplo, para a transferência da BR Distribuidora – maior do setor de distribuição de combustíveis do país – para a iniciativa privada.

Em dezembro de 2017, a Petrobrás arrecadou R$ 5 bilhões ao oferecer 29% das ações da subsidiária. Em julho de 2019, a petroleira se desfez de mais 33,5% do capital que possuía, perdendo o controle acionário da empresa. Em agosto do ano passado, em plena pandemia, o Conselho de Administração da estatal aprovou a venda da participação remanescente de 37,5% na BR Distribuidora, ainda não concretizada.

Com isso, o Estado brasileiro abriu mão de uma rede de 7,7 mil postos de combustíveis construídos em todo o território nacional nos últimos 50 anos. Após a privatização, a nova diretoria da empresa decidiu mudar a identidade da rede conveniada, mas manteve o nome “Petrobras”.

Acontece que desde o início da capitalização a dívida da distribuidora aumentou R$ 4,5 bilhões. Conforme o Relatório de Referência, em dezembro de 2017 a dívida bruta da empresa era de R$ 4,73 bilhões. Em setembro de 2020, data do último balanço disponível, o valor estava em R$ 9,29 bilhões – aumento de 96%.

No mesmo período, foram pagos R$ 5,88 bilhões em juros e dividendos aos acionistas. Este montante ainda não inclui todos os repasses que serão realizados neste ano, referentes a 2020.

Com a privatização, houve o desligamento de 962 trabalhadores, e outros 1.030 tiveram reduções salariais. Alguns cortes chegaram a 50% dos honorários mensais, limite estabelecido no Acordo Coletivo mediado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Por outro lado, o Sindipetro-SP revelou que no final do ano passado a diretoria da BR Distribuidora aumentou o próprio salário em 272%. Em média, os 17 administradores da empresa receberam cada um a quantia de R$ 3.054.146,05 ao longo de 2020, com gasto total de R$ 51.920.483,40.

Somente a diretoria estatutária, formada por cinco integrantes, foi responsável pelo gasto de R$ 41.012.483,40. Em média, cada membro recebeu 8.202.496,68 durante o ano, ou R$ 683 mil reais por mês.

Redação da Agência PT com CUT e imprensa sindical

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