Fontana denuncia queima das principais estatais na Black Friday bolsonarista: Lesa-pátria por interesses escusos

Em quase dois anos de mandato, o governo Bolsonaro não apresentou nenhum projeto estratégico de desenvolvimento para o país, a não ser repetir o receituário neoliberal mais extremado, que se traduz em retirada de direitos, ataque ao serviço público e privatizações, que têm sido a obsessão do ministro Paulo Guedes.

Num contexto em que nossa moeda está fortemente desvalorizada, o governo quer promover uma verdadeira “Black Friday” envolvendo nossas principais empresas públicas, que desempenharam e continuam exercendo um papel fundamental do desenvolvimento do país.

São empresas construídas ao longo de décadas, com recursos dos impostos pagos por todos os brasileiros que produziram crescimento econômico, inovação tecnológica e empregos qualificados, e deram um grande impulso na modernização e industrialização do Brasil.

Não podemos esquecer que parte significativa dos nossos ativos foram entregues por valores irrisórios ao setor privado – em muitos casos, para grupos estrangeiros – durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, destacando-se empresas dos setores de mineração, telecomunicações e siderurgia.

Que benefícios essas privatizações trouxeram ao país?

Para avaliarmos a dimensão do dano que essa grave ameaça pode causar ao país, é importante verificarmos quais são as empresas que o governo quer incluir nesta grande “liquidação”.

Sobre o Banco do Brasil, ainda reverbera a frase chula do ministro Paulo Guedes na deplorável reunião ministerial do dia 22 de abril: “tem que vender essa porra logo!”.

A que ele se referia? A um banco com 200 anos de história, presente em 99% dos municípios brasileiros e em 15 países, que emprega 92 mil pessoas.

Foi reconhecido pela revista Euromoney como o Melhor Banco do Brasil em 2020; pela revista Global Finance como o Banco mais inovador da América Latina em 2019 e 2020; e como a Empresa Financeira mais Sustentável do Mundo em 2019 pelo Ranking Global 100 da Corporate Knights.

Para ver a forma como o governo Bolsonaro trata o patrimônio público, basta dizer que recentemente o Banco do Brasil vendeu por R$ 371 milhões para o BTG Pactual, empresa da qual coincidentemente o ministro Guedes foi fundador, uma carteira de crédito com valor contábil de R$ 2,9 bilhões.

Outro alvo imediato de Bolsonaro e Paulo Guedes são os Correios.

Em 2019, a empresa faturou R$ 18,3 bilhões, empregando mais de 100 mil trabalhadores.

Possui um sistema logístico estruturado para atender todos os municípios do Brasil. A tentativa de privatizar os Correios ocorre em uma conjuntura de consolidação do e-commerce.

Portanto, um sistema como este adquire uma importância estratégica cada vez maior para entrega de encomendas no país e no mundo.

Não é à toa que os primeiros interessados na privatização dos Correios são a chinesa Alibaba, a argentina Mercado Livre e a americana Amazon.

A venda dos Correios para empresas como estas produziria uma enorme desvantagem competitiva, para pequenas e médias empresas nacionais, que dependem da logística para atuar no e-commerce.

Além disso, o comprador receberá um banco de dados com informações públicas de milhões de brasileiros, hoje exclusivo dos Correios, que permitirá a oferta de diversos produtos e serviços de forma vantajosa sobre os concorrentes.

Como presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Eletrobras na Câmara Federal, quero falar sobre essa empresa criada pelo presidente Getúlio Vargas em 1954, a maior do setor elétrico na América Latina, detendo capacidade de geração de cerca de 1/3 do total da capacidade instalada no Brasil, além de 71.153 km de linhas de transmissão.

Ela faturou em 2019 R$ 27,7 bilhões e teve um lucro líquido de R$ 10,7 bilhões.

Em termos qualitativos, mais de 90% da sua capacidade instalada provém de fontes com baixa emissão de gases do efeito estufa.

Que país com dirigentes minimamente sensatos entregaria, muito provavelmente para o capital estrangeiro, uma empresa com importância tão estratégica para a infraestrutura do país?

Além disso, é importante refletir sobre os casos de privatizações fracassadas como o da Light no Rio de Janeiro, vendida durante o Governo FHC para a estatal francesa Électricité de France.

De todas as relacionadas, a Petrobras é a que mais sofre com as privatizações já em andamento.

Em 2018, o grupo faturou R$ 285,7 bilhões e teve um lucro de US$ 7,9 bilhões, empregando mais de 47 mil trabalhadores.

Além disso, pagou US$ 32,5 bilhões em impostos. Durante os governos dos presidentes Lula e Dilma, passou a exigir conteúdo local dos seus fornecedores, no âmbito de uma política industrial que gerou milhares de empregos no Brasil.

Após este período de crescimento, a empresa vem sendo vendida aos pedaços, pela impossibilidade da sua privatização integral.

Este processo se iniciou durante o Governo Temer e vem se intensificando no Governo Bolsonaro, principalmente após a decisão de 2019 do STF no sentido de que as subsidiárias e controladas de estatais podem ser vendidas sem necessidade de autorização do Congresso Nacional.

Esse esfacelamento tende a reduzir ao longo do tempo o valor e a importância estratégica da Petrobras.

Segundo o ranking de 2019 das 1.000 Maiores Empresas do Brasil da revista Exame, BR Distribuidora foi a 2ª maior empresa brasileira com um faturamento em 2018 de R$ 98,6 bilhões e um lucro de US$ 805 milhões.

Pagou US$ 5,6 bilhões em impostos, tem mais de 3.000 trabalhadores e uma rede de 7.700 postos de combustíveis.

Mesmo sendo uma empresa extremamente lucrativa e que opera num setor estratégico, o Governo Bolsonaro usou a possibilidade concedida pelo STF de não precisar de aprovação do Congresso Nacional para fazer privatizações de subsidiárias de estatais e se desfez de 30% das ações da empresa pela bagatela de R$ 9,6 bilhões, sem estardalhaço.

Ou seja, seguiu a receita do Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e passou parte da boiada.

Recentemente, o Conselho de Administração da Petrobras aprovou a venda dos 37,5% restantes das ações que detém da companhia.

Vamos imaginar o tempo, esforço e talento que um grupo empresarial teria que ter para construir uma empresa como a BR Distribuidora. Os afortunados que fizerem a aquisição não vão precisar de nada disso, pois vão receber este patrimônio público das mãos do “patriótico” Governo Bolsonaro.

É significativo que este processo de privatizações do governo se acelera exatamente quando a economia global é afetada pelos efeitos da pandemia e da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China.

Um governo com visão estratégica deveria entender este cenário global e fortalecer estas empresas públicas, fundamentais para alavancar o desenvolvimento econômico.

Além disso, atuar sobre as fontes de problema, como a corrupção, para que com a melhoria dos processos de gestão e transparência restassem só efeitos positivos na atuação das estatais brasileiras.

São todas elas empresas estratégicas e lucrativas.

Vendê-las numa “Black Friday” significa lesar o país, em benefício de interesses escusos.

A sociedade brasileira precisa estar mobilizada para impedir que este processo lesa-pátria avance e provoque danos irreversíveis ao desenvolvimento do país por muitas gerações.

Nós vamos ficar atentos e atuantes no Congresso Nacional para lutarmos ao lado dos que entendem o absurdo destas privatizações.

*Henrique Fontana é deputado federal (PT-RS).

Artigo publicado originalmente no site Viomundo

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